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Nenhuma mulher vai conseguir fazer uma mudança estrutural sozinha em um espaço de poder, diz especialista em D&I

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Foto: Paulo Liebert/divulgação.

Especialista em diversidade, equidade e inclusão há 10 anos, Carine Roos é CEO e fundadora da Newa Consultoria, uma empresa de impacto social que prepara organizações para um futuro mais inclusivo por meio de sensibilizações, workshops, treinamentos e consultoria de diversidade.

Mais de 12 mil pessoas foram impactadas em vivências com mais de três mil horas em salas de aula e mais de 2 mil mulheres mentoradas, que hoje estão mais seguras, mais estratégicas, mais reconectadas com a sua história e com a sua essência.

Em entrevista ao Economia SP, ela fala sobre seu negócio e como empresas podem propiciar um ambiente de trabalho mais acolhedor e inclusivo para mulheres. Confira abaixo:

1. Como surgiu o negócio e quais os principais aprendizados?

Já tenho uma atuação há 10 anos na área de diversidade e inclusão, apoiando especialmente as empresas multinacionais para que possam se desenvolver e ter lideranças mais conscientes de seus comportamentos, além de apoiar mulheres dentro das instituições para que elas cresçam e tenham qualidade de vida. A Newa nasceu, especificamente, no ano passado. Mas, antes disso, eu já tinha uma experiência nesse setor com foco nas mulheres: a Escola Elas. Com a chegada da pandemia, entendi que precisávamos ampliar a nossa atuação não só para trabalhar com as mulheres, mas, principalmente, com as lideranças que estão no topo das empresas e são tomadoras de decisão. Neste mesmo sentido, entendemos que precisávamos olhar de forma mais ampla a interseccionalidade, levando em conta as dimensões não só de gênero, como de raça, classe social, orientação sexual, pessoas com deficiência e pessoas mais maduras dentro das organizações. Assim surgiu essa intenção de trabalhar de maneira mais holística e sistêmica dentro das empresas.

2. Se voltasse no tempo, que conselho daria para você mesma?

A minha trajetória pessoal e profissional está muito conectada, então tudo o que fiz estava muito alinhado aos meus valores. Antes de trabalhar nesse segmento de diversidade, inclusão e agora de saúde emocional, eu trabalhava com comunicação dentro de organizações, como a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e o comitê gestor de internet, coisas que, de alguma forma, estavam conectadas com uma mudança efetiva na sociedade. Entendo que a comunicação é um instrumento que permite que as pessoas tomem melhores decisões a partir do acesso à informação. Então, olhando para minha jornada, eu não mudaria o que eu fiz, não só em termos de segmento profissional, separação societária e depois na minha jornada como CEO, apoiando grandes multinacionais a serem, de fato, mais inclusivas e respeitosas com os colaboradores. Sinto que tenho uma atuação muito congruente com a minha história. Hoje estou fazendo um mestrado em Londres, na LSE, na área de estudos de gênero, algo que vai me permitir ter uma visão não só global, mas inovadora nos negócios e realmente apoiar as empresas a acelerarem a sua diversidade e inclusão.

3. O que te inspira e como você busca inspirar outras mulheres?

O que me inspira é entender que nunca iremos conseguir uma transformação sozinha. É somente pelo coletivo que iremos conseguir promover uma transformação genuína e efetiva, principalmente quando estamos lidando com temas complexos, como justiça social, equidade de gênero, consciência e letramento em Direitos Humanos. Tudo isso é feito de maneira sistêmica, de maneira em rede, trazendo pessoas em diferentes esferas de atuação para pensar junto, de maneira conjunta, sobre como conseguiremos avançar. É um pensamento muito em coletivo, muito em rede e isso me inspira. Quando entendo que eu posso ajudar outras mulheres e que outras mulheres me ajudam a conseguir realizar minhas metas e objetivos enquanto empresa, enquanto Carine, isso se torna inspirador por ser uma troca coletiva.

4. Que iniciativas empresas podem promover para proporcionar ambientes mais inclusivos e igualitários para as mulheres?

O primeiro passo que sempre digo é: escutem as pessoas que já trabalham na sua empresa, principalmente grupos sub-representados, que são mulheres, pessoas negras, pessoas com deficiência, pessoas que se identificam na comunidade LGBTQIAP+, pessoas mais seniores dentro da organização. Então, a partir dessa escuta ativa e do entendimento das necessidades desses colaboradores, a empresa conseguirá ter esse olhar para as necessidades dos funcionários, desenvolvendo um plano estratégico para a organização no sentido de inclusão efetiva. Mais do que pensar em números, metas e em 2025 ter 50-50% de mulheres em cargos de liderança, é preciso entender como a empresa vai, efetivamente, incluir essas mulheres pensando na sua qualidade de vida. É preciso pensar e entender sobre como as organizações podem criar uma estratégia clara de promoção e ascensão dessas mulheres, de como trazer recursos da empresa para desenvolver ações sistemáticas que permitam a sustentabilidade dessas ações, sejam treinamentos ou planos de ações, para que efetivamente tenhamos uma equidade mais genuína.

5. Qual o papel da mulher para fomentar uma liderança humanizada?

O pensamento que a mulher pode ter é um pensamento mais uma vez do coletivo. Afinal, nenhuma mulher vai conseguir fazer uma mudança estrutural sozinha em um espaço de poder. Existem diversas pesquisas que mostram que, pelo menos, precisaríamos de 30% de mulheres, seja no conselho de administração, em nível de diretoria ou gerência, para elas começarem a serem escutadas e levadas a sério em suas pautas. Então, o negócio é sempre pensar como eu posso abrir portas para que outras mulheres possam ter aquilo que estou tendo hoje ou o que não tive e que, provavelmente, mulheres anteriores também não tiveram. Vejo que é sempre com essa visão de abertura de portas. Somos diferentes entre nós, e essa diversidade nos enriquece, mas ao mesmo tempo, não podemos deixar que ela nos invisibilize ou apague. Entendendo as diferentes necessidades e demandas das mulheres, vamos conseguir, de maneira coletiva, criar espaços que sejam de fato mais inclusivos.

6. Qual a importância do exemplo e do apoio de outras mulheres para prosperar no mercado de trabalho e nos cargos de liderança?

Quando temos uma inspiração em uma mulher que conseguiu vencer barreiras e ser congruente com os seus valores, com a sua história e que não abre mão da sua vida pessoal, eu acho que esse é um exemplo de referência que precisamos ter,  especialmente com essa consciência coletiva. Mais importante do que isso é que essas mulheres não repitam padrões e comportamentos masculinos. Em muitos casos, acontece de mulheres ascenderem dentro das organizações e, de maneira inconsciente, reproduzirem comportamentos masculinos, como, por exemplo, acreditar que pelo fato delas terem conseguido chegar lá, qualquer outra mulher conseguiria chegar também. Essa é uma mentalidade de não apoiar, de não contribuir, de não criar um espaço de mentoria e ações temáticas para proporcionar que outras mulheres cresçam e ascendam mais rapidamente. Então, na medida em que nos tornamos mulheres mais conscientes, que reconhecem seus valores inegociáveis e que tem clareza de onde querem chegar, vejo que temos um excelente modelo do que precisamos ter dentro das organizações.

7. Como as empresas podem fomentar um ambiente mais propício para a prosperidade da mulher no ambiente de trabalho? E em alguma área que seja majoritariamente masculina?

Criando ações sistemáticas. Uma vez que entendemos um pouco sobre as necessidades das mulheres dentro de um contexto organizacional, conseguimos começar a pensar em ações, políticas e processos que permitam essas mulheres a se sentirem valorizadas. Hoje vemos sistematicamente muitas mulheres, algumas até em posições executivas, saindo das empresas em que atuam. Isso está muito ligado a um reconhecimento de que apesar de as empresas terem ações, elas não fizeram uma transformação efetiva de seus espaços. Ou seja, as normas, as condutas e práticas continuam sendo muito masculinas, porque quem está no topo das organizações continuam sendo os homens. Então, para mudar isso, precisamos começar a ouvir as pessoas e a entender o que elas precisam. A partir disso, é preciso olhar para a criação de políticas, processos, ações com monitoramento e dinheiro, porque não é possível mudar essa realidade sem disponibilizar recursos para ações que promovam, de fato, essa equidade.

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