Por Vanessa Kotters, diretora de produto da Authen.
Em um dia desses, durante um workshop, uma esportista muito parceira nossa me disse: “eu não sei como você consegue administrar tudo o que ouve sobre os produtos”. Ela ainda discorreu um pouco, mas essa fala ficou reverberando na minha cabeça.
Em tempos de redes sociais, nos condicionamos a falar muito e ouvir quase nada. Ouso a dizer, inclusive, que quem ainda mantém o exercício da escuta pode até ser confundido com complacente ou desinteressante! Sim, como se quem ouve o faz pela falta do que dizer. Ledo engano. O ato de escutar está no contrafluxo da tendência de comportamento, e no meio desse oceano de falas, quem ouve é rei!
E todos sabemos que não é algo fácil, pelo contrário, trata-se de um exercício constante e infinito. Entender o valor da escuta nos meus processos criativos foi certamente um ponto de grande virada, mas ouvir não basta. Elenquei aqui alguns pontos práticos na inovação (ou evolução) de produtos a partir da escuta que considero essenciais:
1) Cavar respostas: na inovação de produtos não espere que o/a consumidor/a tenha respostas prontas e bem amarradas. Normalmente ele/ela mal consegue verbalizar uma dor. Muitas dores são tão abstratas que ainda não tomaram um formato sólido e passível de ser exposto com clareza. Eu vejo como se a resposta essencial que me interessa estivesse envolta de várias camadas que são descascadas a cada pergunta.
2) Promover a troca entre as consumidoras: essa é uma das escutas mais ricas, interessantes (e divertidas), ouvir um grupo de consumidoras(es) trocando experiências, porque são nesses momentos que, por exemplo, elas/eles descobrem que, o que se achava ser uma particularidade, é na verdade um problema comum a várias outras pessoas.
3) Registro e organização do que se escuta: ouvir e apenas ouvir, sem registrar, sem tabular, sem medir, é tempo perdido. Confiar somente no próprio “feeling” sem ter dados claros para análise e cruzamento é bastante perigoso.
4) Entender se sua experiência pessoal é realmente relevante e, se sim, qual o peso: se manter ciente de que o produto não está sendo criado para você e sim para o mercado, e se basear em gostos e preferências pessoais, isso é, fazer o produto com base em você mesma/o é certamente um tiro no pé.
5) Materializar a solução para o que se ouviu: o fundamento essencial do design é resolver problemas (eu amo esse conceito!) e, se estamos falando de algo novo, não existe receita pronta e é aí que entra a criatividade e a testagem. Não, a escuta não é somente um ponto de partida, ela é elemento permanente presente também na testagem até a chancela final.
Ouvir é que nos permite evoluir, mudar rotas, criar, recriar, inovar… nos permite manter tudo vivo e caminhando. Ouvir é fundamental para não estacionarmos, mas a escuta oferece muito mais que isso: nos permite ser precursores.