Por Wagner Moraes, CEO da A&S Partners e especialista em varejo e reestruturação de empresas.
A problemática do varejo brasileiro tem várias camadas, mas podemos começar pelo início, quando o setor foi o que mais sofreu durante os anos de pandemia, com forte retração nas vendas físicas e impulsionamento das vendas eletrônicas, e nem todos estavam preparados para isso.
A perda de caixa resultante desse período elevou muito o endividamento das empresas do setor, aumentando a percepção de risco das grandes redes, que dependem de capital de giro para manter as suas operações.
Após o ocorrido com as Lojas Americanas, a percepção de risco do setor aumentou ainda mais ainda. Os grandes Bancos ligaram um sinal de alerta em função da insegurança dos números mostrados nos balanços e elevação do endividamento, comprometendo a capacidade de pagamento das empresas. Cortaram fortemente limites de crédito disponíveis e passaram a avaliar cada caso isoladamente com uma análise de crédito bem mais criteriosa.
Com isso, as empresas varejistas sobre endividadas e com forte necessidade de caixa passaram a sentir mais a retração no capital de giro de suas operações e começaram a ter dificuldades para renegociarem e alongar as suas dívidas, se refletindo na retração de suas atividades.
As linhas de financiamento ficaram bem mais escassas por parte dos bancos, bem como o custo do dinheiro mais elevado frente ao que era antes, pois os bancos aumentaram os spreads de suas operações em função da elevação do risco para operar com essas empresas. Esse movimento é perfeitamente plausível. Eleva-se o risco de inadimplência no mercado e, por consequência, os spreads bancários também são elevados na mesma proporção.
Com a presença dos varejistas chineses no país se intensificando e ganhando cada dia mais espaço dentro do mesmo público-alvo que as varejistas atuantes no Brasil, observamos o quão prejudicial é para as companhias focadas em média e baixa renda, uma vez que as asiáticas têm planos de aumentar o ambiente já competitivo do setor. Se tomarmos como exemplo o crescimento da gigante chinesa Shein, isso deve acender um alerta para os varejistas, mas não é necessariamente um risco, no momento, pois ainda existe espaço no mercado nacional para os grandes varejistas.
Sobre se podemos ter uma previsibilidade de outras grandes que podem pedir recuperação ainda este ano, é muito provável que já esteja começando a acontecer, podemos citar como exemplo redes como Tok & Stok e Lojas Marisa.
Tem outras grandes varejistas que atravessam por momentos delicados de caixa e sustentabilidade de suas operações. Se não conseguirem melhorar as suas performances num prazo muito curto, poderão passar por instantes de recuperação judicial ou extrajudicial. Esta movimentação de enxugamento traz um ambiente ruim para a economia e para muitas famílias brasileiras, pois significa menos emprego. Imagine que uma grande varejista emprega mais de 3 mil funcionários, isso significa que estamos falando de uma base de 12 mil pessoas, se formos contabilizar que cada 1 funcionário é um pai ou mãe de família, com uma base de 4 pessoas para sustentar.
Por isso, o Governo está entre “a cruz e a espada”, pois entende que o setor está precisando de ajuda para se recompor e, por conta disso, deverá prover linhas de crédito e financiamento para manter minimamente as empresas, decorrente da falta de apetite dos bancos.
Por outro lado, entende que se atuar na tributação das empresas estrangeiras, poderá contribuir para um alargamento de preços e, consequentemente, aumento na pressão inflacionária. Mas, o que pesa mais é a saúde do mercado local e deverá se posicionar brevemente com linhas e medidas para auxiliar o setor no curto prazo.
Vale ressaltar que, por mais que o mercado digital esteja crescendo no país, e a tendência é se manter, ainda não representa nem 15% das vendas totais.
Uma boa estratégia para as varejistas nacionais é utilizar o negócio físico para potencializar a experiência de compra on-line, para o consumidor ver com os próprios olhos o produto, antes de fechar uma compra digital, ou até mesmo como estratégia de marketing, para ficar na lembrança dos consumidores. Foi o que a Shein fez com a instalação de sua loja física, no modelo pop-up, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Por outro lado, a presença massiva das grandes empresas chinesas no país tende a agravar o quadro competitivo nos próximos anos e tomar um espaço ainda maior, pois otimizam bastante o processo logístico de entregas e possuem preços muito competitivos. Por conta disso, é muito provável que o Governo entre com o aumento da tributação, ainda neste ano, para as compras feitas de empresas estrangeiras, com o objetivo de melhorar a competitividade do país.
Sim, essas empresas também são responsáveis pelo enfraquecimento do varejo no país, porém em menor escala. Um dos principais fatores é o desaquecimento da demanda decorrente do achatamento da renda familiar e juros elevados que geram aumentos nos preços das mercadorias.
O varejo precisa de “reinventar”, ou mesmo acelerar novas tecnologias e posicionamentos mercadológicos, para conseguir sobreviver neste ano tão difícil, onde o cenário de crescimento de consumo não está ajudando, pois o PIB está projetado para um crescimento de 0,90%.
O baixo crescimento econômico é esperado e, combinado com juros elevados, endividamento das famílias e incertezas quanto à sustentabilidade dos baixos índices de inflação, pode-se esperar uma limitação da demanda para o setor neste ano.
É mandatório para as empresas reduzirem custos, recuperarem performance e geração de caixa para, com isso, reduzirem a sua dependência de capital de bancos. O custo do dinheiro se manterá elevado em função dos juros praticados para esse ano.
Uma das saídas é a digitalização das empresas que seguirá a passos largos, as ações e estratégias omnichannel ganharão ainda mais espaço e ainda se espera a redescoberta das lojas físicas.
Sim, devemos ter impactos nos preços, porém não fortes em função do aumento da concorrência das empresas estrangeiras no nosso mercado, as quais têm custos e preços menores. Caso o governo opte por tributar as empresas estrangeiras, abrirá espaço para que as empresas nacionais possam aumentar as vendas e, quem sabe, aumentar os preços de forma mais consistente.