A redução do uso de dinheiro em papel moeda, o avanço da digitalização, e a crescente adoção de tecnologias como blockchain, criptomoedas, tokenização e contratos inteligentes (smart contracts) estão moldando o nosso futuro e impulsionando a evolução do mercado financeiro por meio do DREX. Esta é a quarta e última grande frente da agenda de inovação do Banco Central, juntamente com a internacionalização da moeda e a abertura dos mercados de capitais, o PIX (considerado como sistema de pagamentos universal) e o Open Finance.
A solidez do projeto brasileiro
CBDCs, ou “central bank digital currencies,” representam uma forma de dinheiro digital lastreado por moeda física emitida pelos bancos centrais de cada país. O DREX é a versão brasileira desse conceito, o Real Digital, que será cotado na proporção de 1:1 com o Real físico que já conhecemos.
Ser uma CBDC é a primeira e enorme diferença quando comparamos com criptomoedas “comuns” ou até mesmo com stablecoins (criptomoedas privadas).
Embora o mercado e a regulamentação das criptomoedas estejam avançando positivamente em todo o mundo, buscando proporcionar cada vez mais segurança e rastreabilidade, a maioria da população ainda possui receios e está longe do perfil dos early adopters do universo das cripto. Entretanto, com o DREX, esses receios estão diminuindo fortemente devido à importância e credibilidade do BACEN.
Não podemos esquecer que o papel do Banco Central do Brasil, uma instituição pública, nunca mudará. Em linhas gerais, suas responsabilidades incluem garantir a gestão do Real, a solidez do Sistema Financeiro Nacional, a manutenção da estabilidade financeira, a definição da política monetária e regulamentações, bem como a supervisão de bancos e outras instituições financeiras, além da operação do sistema de pagamentos como um todo.
O DREX não apenas está alinhado com as responsabilidades do BACEN, ao contrário do que alguns argumentam, mas também coloca o Brasil de maneira sólida no futuro das finanças. Isso não se limita à entrada no cenário “DeFi” (finanças descentralizadas), onde serviços financeiros operam em blockchain, mas também impulsiona avanços significativos em termos de inclusão financeira, redução de custos de transação, superação de barreiras transfronteiriças (transações cross-border), redução do papel moeda em circulação nas ruas e aumento da segurança e praticidade por meio do dinheiro programável e smart contracts. Estes contratos, por sua vez, garantem que os acordos, que antes dependiam exclusivamente da confiança mútua, agora só sejam concluídas quando ambas as partes cumprirem seus compromissos, transacionando diretamente em DREX.
CBDCs como tendência mundial
A ideia da criação das “central banks digital currencies” está em pauta há mais de 30 anos, por incrível que pareça, desde o case da AVANT, um cartão com dinheiro digital emitido pelo Banco Central da Finlândia nos anos 90. Infelizmente, o projeto foi descontinuado após poucos anos de uso devido às dificuldades de explicação e, consequentemente, à falta de adoção pela população, juntamente com os altos custos e outras questões.
Hoje, com um mundo digitalizado, a blockchain, smartcontracts, tokenização e criptomoedas em pauta e circulação há anos, torna-se muito mais simples explorar a usabilidade de uma CBDC. Portanto, não é surpresa que cerca de 90 países estão explorando esta ideia, e cerca de 60% deles já tem um projeto em desenvolvimento. Os que chamam mais atenção, além do case brasileiro, são o Sand Dolar nas Bahamas, o DCASH no Caribe Oriental, o Project Aber que é uma iniciativa conjunta dos bancos centrais da Arabia Saudita e dos Emirados Arabes, o eNaira (primeira CBDC já em funcionamento da Africa) emitido pela Nigéria, e é claro o e-CNY do banco central chinês que já atingiu cerca de USD250 bilhões de doláres em volume transacionado (ainda representando uma fração pequena da circulação de dinheiro na China, porém com mais de 120 milhões de carteiras abertas).
Preocupações com o DREX
Como mencionei anteriormente ainda existem e existirão receios em relação ao DREX, o que é comum em qualquer processo de inovação. Muitas dessas preocupações se relacionam com os problemas de segurança e rastreabilidade associados às criptomoedas, que felizmente estão sendo abordados ao longo dos anos. No entando reforço que este não é o caso das CBDCs, dado a emissão via Banco Central. Também podemos ouvir no mercado preocupações em relação á conectividade e usabilidade para o usuário final. Quanto à conectividade, as diretrizes do Banco Central para os consórcios participantes da criação do DREX são claras e vão em linha com os melhores parametros internacionais, muito diferente de casos como a CBDC caribenha, que ficou fora do ar por meses por exemplo. Agora, quanto à usabilidade,podemos destacar o sucesso recente do PIX, que estabeleceu recordes de transações e se tornou amplamente reconhecido. Vejo o DREX seguindo um caminho semelhante ao PIX, embora naturalmente seja mais desafiador devido à sua interface tecnológica. Com o tempo, essa interface deve se tornar cada vez mais comum e facilidade pelas instituições financeiras, a questão é saber quanto tempo isso levará.
Como o mercado deve se preparar para a chegada do DREX?
Antes de mais nada, é importante lembrar que, embora haja um grande interesse pelo assunto e o projeto esteja avançando bem, o DREX ainda está em uma fase inicial de desenvolvimento pelos consórcios envolvidos. O DREX só deve chegar ao público por volta de 2025. Até lá, haverá muitas discussões e divulgações essenciais para que a população em geral comece a entender o conceito da moeda digital e suas aplicações em nossas vidas.
Acredito que tanto empresas comuns quanto instituições financeiras podem se preparar para o DREX e a agenda do Banco Central explorando papéis como provedores de infraestrutura, otimizando a interoperabilidade, monitorando a liquidez das moedas digitais e até mesmo desenvolvendo novos processos e governança para KYC, PLD (prevenção à lavagem de dinheiro) e combate ao terrorismo.
Não devemos também deixar de pontuar diversas “quick-wins” que veremos já no início da operação do DREX, como a execução dos smart contracts, a injeção de capital e a melhoria da liquidez resultante do avanço operacional e da redução dos custos de transações transfronteiriças, bem como o lançamento de produtos “powered by DREX,” como títulos públicos ou a padronização da reserva de ativos tokenizados e stablecoins diretamente na forma de Real Digital.
Em resumo, o DREX representa um marco inovador para o Brasil, nos posicionando ainda mais na vanguarda da aplicação de tecnologias do mercado financeiro ao nosso cotidiano. Juntamente com outras CBDCs, este projeto é sustentado por um sólido plano de negócios baseado em princípios e avanços significativos para o mercado. O DREX está destinado a se tornar parte integrante de nossas vidas nos próximos anos. Acredita-se até que o sistema financeiro nacional como um todo nunca mais será o mesmo.