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A igualdade feminina e a gente com isso

Foto: divulgação.
Foto: divulgação.

Por Paola Müller, Head of Strategy da Brivia.

Sempre que se trata de igualdade feminina é a mesma história: os mais diversos conteúdos sobre o papel da mulher nas organizações, a necessidade de ter ambientes mais plurais e inclusivos, a premissa da diversidade como impulsionador da criatividade e números. Além disso, muitos números mostrando o quanto nosso universo corporativo ainda está engatinhando para tornar todo esse discurso institucional, de fato, uma realidade. 

Confesso que destes números já estou um pouco cansada e vou me fazer valer de apenas uma estatística: segundo o relatório de 2022 do Fórum Econômico Mundial, serão necessários 132 anos para diminuir o gap de igualdade de gênero. Cento e trinta e dois anos. Abstraindo um pouco o teor científico, vai levar de três a quatro gerações para que homens e mulheres possam ocupar os mesmos espaços, sem juízo de valor, e ganhar os mesmos salários para tarefas as quais ambos têm a mesma capacidade de cumprir. Já imaginou? Talvez as netas das minhas netas (que ainda estão longe de existir) possam viver isso. 

Parece que falar sobre igualdade feminina é sempre sobre o amanhã. Mas, o que me pergunto todos os dias é o que a gente pode fazer hoje? É posto que essa é uma realidade que precisa de todo mundo para ser alterada, mas também é fato que não é responsabilidade das mulheres ensinarem os homens. Na minha visão, o que precisamos é de abertura ao diálogo, menos distanciamento e mais vontade. Não é sobre “eles”, é sobre “nós”. E os números, eles de novo, nos mostram que viver em uma sociedade mais igualitária é bom pra todo mundo. Melhores políticas públicas, melhores serviços, melhores práticas de gestão, melhores produtos, ambientes de trabalho mais saudáveis, engajadores e lucrativos. Então, o que podemos fazer sobre isso? Aqui estão os meus vinte centavos de contribuição para tornar o ambiente corporativo mais horizontal.

Em discussões em grupo, devemos promover espaços que promovam trocas e que, acima de tudo, mulheres (e pessoas que representam grupos minorizados) se sintam confortáveis para expor suas opiniões sem julgamentos. Demonstrar interesse, questionar de forma genuína e escutar ativamente são partes essenciais de um bom diálogo. Convidar as pessoas para contribuírem é o primeiro passo. Monopolizar a conversa não torna a discussão produtiva. Pelo contrário: passa a ser apenas uma validação de pontos de vista unilaterais.

Ao ouvir essas contribuições e levá-las adiante, é necessário sempre dar o crédito a quem teve a ideia. Apropriar-se da ideia de uma mulher sem considerá-la é uma forma de violência e perpetua o apagamento social feminino — podendo gerar danos psicológicos, bloqueio criativo e desvalorização da mulher no mercado de trabalho. É dever de todos combater essas manifestações. Você está fazendo sua parte? Reflita. 

Por falar em combater, como andam seus vieses? Reproduzir práticas machistas e justificá-las com um “sempre foi assim”, “mas eu fui criado assim”, “de onde eu vim é assim” é lançar mão de um atestado de preguiça. Preguiça de ver, viver e promover a mudança. Preguiça de traduzir e responder ao espírito do tempo. E convenhamos: ninguém quer ser reconhecido como um profissional (e indivíduo) preguiçoso. Por isso, lute contra seus preconceitos, questione seus pensamentos (ou julgamentos?) automáticos e tome pra si esse exercício constante, considerando que esse é um bote salva-vidas no meio do oceano de evoluções (necessárias) que navegamos. 

Aos recrutadores e equipes de capital humano, estabelecer metas de representatividade e iniciativas de base para construir um ambiente de equidade é importante para chancelar institucionalmente e dar o valor que a necessidade exige. Não sabe por onde começar? Espelhar, dentro da empresa, a distribuição de gênero da população onde ela está localizada pode ser um bom início. E, na hora de recrutar, crie vagas afirmativas. É preciso sair da zona de conforto e ir até onde outros não vão para buscar novos olhares. Inovação é feita por gente com repertórios que se somam, não que se repetem.

E, por fim, aos líderes: muito se fala sobre nosso papel de exercitar a empatia. Mas eu aprendi na Antropologia que a empatia pode ser uma falácia. Uma falácia pelo simples fato de ser humanamente impossível se colocar no lugar do outro com seus medos, suas convicções, seu contexto, seu histórico, suas lutas e aflições e tentar replicar os mesmos comportamentos. Imagine quantas decisões, nós, mulheres, tomamos em uma reunião presencial: uma roupa confortável o suficiente para o deslocamento, mas não tão confortável a ponto de parecer desleixada. Uma maquiagem trabalhada o suficiente para esconder o cansaço e as marcas do tempo, mas não tão trabalhada a ponto de parecer vulgar. Uma postura segura o suficiente para mostrar confiança, mas não tão segura a ponto de parecer pretensiosa. Um discurso contundente o suficiente para convencer, mas não tão contundente a ponto de parecer agressiva. Por mais empático que se tente ser, é muito difícil chegar ao mesmo nível de resoluções feitas a cada minuto para tentar responder às expectativas e “padrões” preestabelecidos existentes no mundo em que vivemos. 

Por isso, prefiro a abordagem da sensibilidade. Homens, vocês podem ser mais sensíveis, está tudo bem. Entendo que o outro não vai conseguir ter o mesmo sentimento daquela mulher que passa por isso todos os dias, mas o que ele pode (e deve) fazer é exercitar uma leitura mais aberta, honesta e sensível sobre as necessidades latentes do contexto, questionando as barreiras e dando o suporte necessário para que essas dores sejam minimizadas e mudanças sejam provocadas. Mais uma vez, não é sobre “eles” (é também), mas é muito mais sobre “nós” (todas e todos nós).

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