Criada em 2022, a Humora é uma startup brasileira de cannabis medicinal, liderada por Ana Júlia Kiss, ex-executiva da indústria química. A empresa foca em auxiliar na importação de produtos de cannabis para o uso cotidiano.
A Humora possui duas empresas com operações distintas. Uma delas está localizada em Nevada (EUA), mas os produtos são feitos na Califórnia. A outra empresa está presente no Brasil, e sua função é auxiliar as pessoas a acessarem esse tratamento por meio de orientação médica, sendo todo o processo realizado dentro da plataforma.
A meta da empresa é simplificar a jornada daqueles no Brasil que procuram tratamentos com produtos derivados da cannabis.
O Economia SP Drops conversou com Ana Júlia para saber mais da Humora e da jornada empreendedora que a levou a inovar com a Cannabis no Brasil. Confira:
Como você decidiu se tornar empreendedora e qual foi a motivação por trás disso?
Ana Júlia: Cresci sendo preparada para assumir a liderança de uma empresa nacional da minha família que era um negócio de sucesso, que se tornou multinacional sob a minha liderança, onde passei de estagiária até me tornar CEO. Passei por diversos departamentos, mergulhando no laboratório e descobrindo a importância dos adesivos industriais, já que era uma empresa do segmento. Ali eu conheci, de fato, a estrutura do produto que eu vendia, e me apaixonei pelo negócio e processo. Descobri que a cola vai em todos os produtos que imaginamos e o quão necessário era a empresa no mercado. Essa experiência moldou minha paixão pelo negócio e me inspirou a liderar. Aos 28 anos, assumi o cargo de CEO, em meados de 2013. Em 2017, vendi a companhia para a maior empresa multinacional do segmento, H.B Fuller. Aprendi tudo com o meu pai, que foi o mentor por trás das ideias que executava em meus primeiros passos como gestora. Chegou um momento que comecei a ser reconhecida e enxerguei o mercado de forma diferente. Foi então que, em 2020, me desliguei desse grande grupo e decidi tirar um ano sabático. Passei a viver durante um tempo em motorhome, em busca da autodescoberta profissional e pessoal. Durante o período, me tornei investidora-anjo de startups focadas em impacto social e/ou lideradas por mulheres e comecei a entender os diversos negócios que são tendência no mundo, como os medicamentos feitos à base de cannabis, por exemplo. Vivi experiências maravilhosas e, durante esse processo, tive certeza de que queria fazer algo diferente. Me deparei, lá fora, com um universo de cannabis com horizonte incrível para ser explorado. Vi que em outros países problemas habituais como insônia e depressão, por exemplo, são tratados com canabidiol e tem dado certo. Por que não trazer esse conhecimento para os brasileiros?
Como você vê o papel das mulheres no mundo dos negócios e como isso evoluiu ao longo do tempo?
Ana Júlia: Desde a indústria química que liderei sempre vi a ausência de vozes femininas, assim como na política e também na maioria dos cargos de liderança. A minha dor foi ter visto uma ideia nova e moderna ainda replicando modelos patriarcais de concentração de poder e masculinidade, então, através do mercado da Cannabis, me vi novamente em uma posição de precisar me dispor e fortalecer para ser mais uma mulher referência nesse mercado. A presença de lideranças femininas tem sido crucial, demonstrando a importância da diversidade para a inovação e o sucesso empresarial. Apesar dos avanços notáveis, é importante reconhecer que ainda enfrentamos desafios persistentes. Estamos em um caminho de evolução, mas é fundamental continuar quebrando barreiras para alcançar uma verdadeira igualdade de oportunidades no mundo dos negócios. Essa é uma jornada contínua, e estou comprometida em contribuir para esse progresso.
Qual é a importância do networking e do apoio entre empreendedoras para o sucesso nos negócios?
Ana Júlia: A importância do networking e do apoio entre empreendedoras é inestimável, algo que vivenciei de forma marcante ao longo da minha jornada, principalmente como empreendedora. Atualmente, atuando como mentora, testemunho o poder transformador da colaboração entre mulheres empreendedoras. Essa sinergia não apenas fortalece nossos negócios, mas também cria um ambiente propício para o crescimento coletivo e a superação de desafios. Acredito que as mulheres naturalmente compartilham e fazem trocas de experiências devido ao fato de serem tão poucas e não terem tantos exemplos de figuras femininas, portanto, se faz necessário essa troca para aprendermos e crescermos mais rápido, gerando uma rede de apoio e sororidade.
Quais são os principais obstáculos que as mulheres empreendedoras ainda enfrentam atualmente?
Ana Júlia: Apesar de termos alcançado progressos significativos, as mulheres ainda enfrentam desafios, especialmente em um mercado como o qual atuo, o de Cannabis. Um dos principais obstáculos que enfrentamos é a dupla jornada, relacionada à economia da atenção e à economia do cuidado, que muitas vezes não são devidamente valorizadas. Estamos integradas no mercado de trabalho, buscando remuneração igualitária e respeito às nossas particularidades, como menstruação e TPM, enquanto também desempenhamos o papel de figura materna presente. Outro desafio considerável foi ingressar no mercado da cannabis, predominantemente liderado por figuras masculinas, apesar de o movimento da cannabis para cuidados no Brasil ter sido fundado por mulheres. Após conquistar meu espaço como executiva em uma empresa renomada, continuo a lutar no mercado de inovação, ao lado de outros grandes nomes, para avançar nas conquistas pela igualdade de oportunidades. Nosso compromisso contínuo em superar esses obstáculos é vital para garantir um ambiente de trabalho verdadeiramente equitativo e inclusivo, onde todas as mulheres possam prosperar e contribuir plenamente para o sucesso empresarial.
Como você vê a representatividade das mulheres em posições de liderança e como isso influencia o empreendedorismo feminino?
Ana Júlia: Honestamente, ainda observo uma representatividade feminina inadequadamente baixa. Torna-se imperativo que as mulheres se destaquem, evidenciando que lideranças femininas não apenas oferecem melhores resultados e ideias mais diversificadas, mas também são essenciais, especialmente no contexto do mercado da Cannabis. Este setor, centrado em torno de uma planta com características intrinsecamente ligadas à feminilidade, demanda uma presença mais significativa de mulheres. Acredito que cada avanço de uma mulher nesse ramo cria um efeito cascata, impulsionando outras a seguir o mesmo caminho. Assim, cada exemplo contribui positivamente para as estatísticas, fortalecendo nossa posição de forma geral. Diante dessas considerações, decidi me envolver em um mercado predominantemente liderado por homens, com o objetivo não apenas de mentorar outras mulheres, mas também de proporcionar uma maior visibilidade, ajudando-as a crescer nesse setor.
Quais são suas fontes de inspiração no mundo dos negócios?
Ana Júlia: Minha maior inspiração foi meu pai, um mentor valioso. Aonde quer que eu vá, costumo dizer que meu pai e eu sempre formamos uma dupla; ele era o Batman e eu, o Robin. Posso afirmar, com total certeza, que aprendi muito com ele. Além do meu pai, outra figura da minha família que é uma grande inspiração para mim é o meu irmão, que sempre foi meu braço direito. Quanto às minhas figuras de inspiração femininas, elas vão desde Beyoncé até Patricia Villela, que desempenha um papel social e econômico muito forte no Brasil e defende movimentos em prol da Cannabis no país. Também é relevante considerar que durante meu ano sabático, a vivência em novos negócios e a descoberta do potencial da cannabis medicinal foram fontes transformadoras de inspiração.
Quais são seus próximos planos e objetivos?
Ana Júlia: Meu foco está na Humora. Na empresa, pretendemos alcançar um faturamento mensal de R$ 100 mil até o final de 2023 e, em 2024, atingir a marca de R$ 500 mil. Quero contribuir para o bem-estar diário das pessoas, desmistificando o uso da cannabis de forma legal e inovadora.