Por Li Saito, head de implantação de projetos na B2Mamy.
O algoritmo me conhece bem, sou dedicada a trabalhar para tornar mulheres líderes e livres, e a cada dia me apaixono mais por recursos e ferramentas baseadas em IA. Por isso, não é surpreendente perceber que fui bombardeada por matérias abordando a pesquisa da McKinsey sobre o impacto da Inteligência Artificial na carreira das mulheres. Mas, sinceramente, o único pensamento que tive foi: “Qual é a novidade, pessoal?”.
Para fundamentar minha falta de surpresa neste caso, gostaria de iniciar dando alguns passos para trás, para que você compreenda por que o relato da pesquisa não me surpreendeu. Historicamente, as mulheres têm sido as mais afetadas proporcionalmente em relação aos homens, enfrentando cortes salariais e perdendo seus empregos a cada crise ou recessão. Um estudo conduzido em novembro de 2018 pelo FMI revela que, em média, as mulheres enfrentam um risco de 11% de perder seus empregos devido à automação, em comparação com 9% para os homens. Assim, embora muitos homens tenham perdido o emprego naquele ano devido à automação, estimava-se que 26 milhões de posições ocupadas por mulheres em 30 países estavam sob alto risco de desaparecer nos próximos 20 anos devido aos avanços tecnológicos.
Outra pesquisa, desta vez conduzida pelo PNAD Contínua do IBGE, revela que, somente durante a pandemia, mais de 8 milhões de mulheres saíram da força de trabalho brasileira. Dessas, 26% afirmaram não poder trabalhar devido a responsabilidades com afazeres domésticos, filhos ou outros parentes. Menos de 2% dos homens alegaram não procurar trabalho pelos mesmos motivos. Isso ocorre enquanto as mulheres recebem cerca de 20% menos do que os homens no Brasil. A disparidade salarial entre os gêneros permanece elevada mesmo quando se compara trabalhadores com o mesmo perfil de escolaridade e idade, na mesma categoria de ocupação.
Quando falamos de mães, a situação se torna ainda mais alarmante. Aproveitando a abordagem da ‘Síndrome do degrau quebrado’, destacada na pesquisa ‘Women in the Workplace’ (2021) da Leanin e McKinsey, que discute as barreiras na ascensão das mulheres a cargos mais altos nas organizações, podemos imaginar como o fato de se tornar mãe amplia exponencialmente as chances de discriminação para essas mulheres. Elas já são penalizadas por crenças limitantes sobre sua capacidade de desempenhar funções tão bem quanto os homens, além de enfrentarem fatores socioculturais. A maternidade pode torná-las ainda mais vulneráveis a serem excluídas de oportunidades de promoção, sujeitas a cortes salariais ou a perda de vagas, sob o viés de que “seriam menos comprometidas ou produtivas”.
A pesquisa da McKinsey destaca a urgência de agir diante dessa situação. Garantir que as mulheres tenham os recursos e o apoio necessários para se adaptar às mudanças causadas pela inteligência artificial é crucial para manter e ampliar sua presença, ainda limitada, na força de trabalho. As áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática oferecem boas oportunidades de emprego. Incentivá-las a estudarem nessas áreas é essencial. Além disso, programas que facilitem a conexão entre mulheres profissionais e forneçam orientação e apoio para suas carreiras são passos importantes para reduzir a desigualdade de oportunidades.
Por fim, trago estudos antigos para explicar por que não me surpreendi com os dados divulgados. Isso é algo recorrente que acontece em diferentes lugares e épocas. Lidar com as mudanças causadas pela inteligência artificial no trabalho das mulheres é um desafio que precisa da colaboração de vários setores. Portanto, é essencial adotar políticas públicas, programas educacionais e iniciativas privadas que garantam oportunidades iguais independente de cor, gênero, raça e/ou etnia. Vamos juntas!