Por André Gurgel, CEO do Procurement Club.
Com o passar das décadas, populações de vários países perceberam que o capitalismo raiz, nu e cru, é comprovadamente o melhor modelo para geração de riquezas. Entretanto ele sozinho se provou não ser capaz de promover sua justa distribuição.
Este mesmo resultado é percebido em todo mundo, com alguma graduação desta má distribuição. Infelizmente aqui no Brasil temos um dos índices mais expressivos quando nos comparamos com outras nações.
Mesmo nos EUA, maior economia do planeta, estes efeitos são percebidos.
Segundo o último Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD), a desigualdade de renda aumentou mais nos EUA do que em qualquer outro país desenvolvido desde 1980.
Estes efeitos colaterais do capitalismo fizeram com que algumas vertentes deste modelo acabassem pipocando mundo afora como o capitalismo colaborativo, criativo, integral e o consciente.
O capitalismo consciente, ou capitalismo de stakeholders, tem como propósito não apenas gerar riqueza para seus sócios e acionistas, mas sim atender as expectativas de diversos atores que orbitam o universo de seus negócios, os tais stakeholders.
Nesse contexto, não somente a riqueza, mas também atributos como propósito, bem social, ambiental, ético, intelectual, dentre outros, acabam por entrar no radar de ações destas empresas.
Muitas barreiras precisam ser vencidas para que este modelo avance de forma consistente nas organizações, passando prioritariamente por quem as empresta seu DNA, os seus líderes.
Empresas conscientes são lideradas por profissionais igualmente conscientes. Neste contexto, a diversidade dentro das empresas, em especial na camada de liderança, passa a ser uma ação muito importante e necessária para avançarmos com mais êxito.
Tendo líderes advindos de múltiplos extratos da sociedade a empresa torna-se mais capaz de capturar as demandas de um maior espectro de indivíduos.
Este processo não é simples nem fácil, até porque a escolha dos futuros líderes recai nos ombros dos atuais.
Desta forma, este modelo acaba por perpetuar um perfil dominante e pouco diverso. E assim acabamos mantendo o mesmo modelo de gestão de negócios, década após década.
Por outro lado, eventos extremos têm abalado o mundo todo nos últimos tempos. Estes eventos apontam para a necessidade urgente de colocarmos a pauta ambiental e social em primeiro plano. Daí vimos crescer a nova face da sustentabilidade nas empresas, o ESG.
O interessante desta agenda é que ela vem desafiando muitos líderes tradicionais em seu modelo de gestão. Infelizmente, alguns deles, frente a este desafio, acabaram recorrendo a prática do “ESG Fake News”, ou do que no meio corporativo chamamos de greenwashing.
A percepção concreta compartilhada por todos é de que estamos perdendo esta batalha e que as ações humanas voltadas para melhorar a vida das pessoas estão sendo insuficientes.
Não tenho bola de cristal para ver o futuro, porém acho razoavelmente fácil de prever que as demandas sociais no mundo inteiro devem se acentuar, as questões climáticas extremas idem e com isso a insatisfação popular vai continuar gerando zonas de instabilidade pipocando aqui e ali ao redor do mundo de forma cada vez mais recorrente.
Para mudarmos esta rota certamente temos que fazer algo diferente do que fizemos até os dias de hoje.
E as empresas têm papel fundamental nisto tudo. Só precisam de fato entender que estas ações são também sua responsabilidade e assumir a liderança natural nesta batalha.
Um amigo certa vez me disse que “Trabalhar pelo coletivo não é doar o que nos sobra, mas sim o que nos faz falta”. Gostei da frase porque me fez refletir e me provocou olhar a questão por um outro ângulo.
Não se trata de atuar no ESG com o que entregamos organicamente ou com sobras de verbas e eventuais recursos ociosos. Como por exemplo, criar uma frente de voluntariado para os profissionais da empresa atuarem e satisfazerem sua demanda pessoal de fazer o bem ao próximo, porém em suas horas vagas.
Na verdade, trata-se de colocar no plano de metas e projetos da empresa ações voltadas aos stakeholders em pé de igualdade com as metas de crescimento do resultado.
Trabalhando mais com foco no propósito. Sempre lembrando que pessoas e suas demandas particulares vão muito além de indicadores em dashboards. Estes são ótimos para promover uma boa gestão e medir avanços em iniciativas, mas incapazes de traduzir expectativas e a real felicidade humana.
E para concluir, em um mundo em que estamos entregando nossa inteligência gradativamente as máquinas, pessoas que conheçam de pessoas deverão ser cada vez mais diferenciadas e raras no meio corporativo. E assim, a chave mestra para que o capitalismo consciente prospere neste cenário é a da diversidade e inclusão.