Por Adilson Batista, especialista em IA Generativa e CIO da Cadastra.
Nos últimos anos, percebe-se os avanços impressionantes da China no campo da inteligência artificial (IA). Esse crescimento não chama atenção apenas pela rivalidade tecnológica entre potências como EUA e China, mas principalmente pelo impacto real da IA na economia e na sociedade global.
Sempre surge a pergunta: será que a China realmente já assumiu a liderança na IA? Embora muita gente diga que sim, precisamos ter uma visão mais ampla e cuidadosa antes de tirar conclusões definitivas.
A rápida ascensão chinesa
Tudo começou a ganhar força em 2017, quando o governo chinês lançou o “New Generation AI Development Plan”, um plano ousado para transformar o país no maior líder global em IA até 2030, com um mercado previsto em cerca de US$ 150 bilhões.
Desde então, a China disparou. Em 2017, quase metade dos investimentos mundiais em startups de IA já vinham de lá, superando até mesmo os Estados Unidos.
Atualmente, o mercado chinês já vale mais de US$ 70 bilhões, com milhares de empresas atuando em áreas como reconhecimento facial, veículos autônomos e robótica avançada.
Quantidade versus qualidade tecnológica
Quando olho para a produção tecnológica, percebo que a China lidera claramente em número de patentes e publicações acadêmicas sobre IA, superando os EUA por uma boa margem. Empresas chinesas já dominam áreas específicas, especialmente reconhecimento facial, com uma precisão e escala impressionantes.
Mas, quando analisando mais a fundo, os EUA ainda estão na frente em termos de inovação disruptiva, especialmente na criação de modelos avançados que são a base para inúmeras aplicações comerciais. Ou seja, a China tem avançado rápido em quantidade e aplicações práticas, mas ainda está atrás nas áreas mais sofisticadas e inovadoras.
Uma economia transformada pela IA
Economicamente, não há dúvida de que a IA está revolucionando profundamente a China. A previsão é que até 2030 a IA possa adicionar cerca de US$ 7 trilhões ao PIB chinês, uma transformação enorme.
Grandes empresas como Alibaba, Tencent, Huawei e Baidu têm utilizado a IA intensamente para otimizar operações, reduzir custos e aumentar eficiência, criando um ciclo virtuoso de crescimento. Nesse sentido, a IA já é peça-chave para a competitividade global da China.
A dimensão política e ética
O aspecto político dessa história é fascinante. A China vê a IA não só como uma ferramenta econômica, mas também como uma questão estratégica e de segurança nacional. O próprio presidente Xi Jinping reforçou várias vezes a importância da liderança em IA.
Por isso, o Estado controla rigorosamente o setor, incentivando parcerias entre governo, empresas e instituições acadêmicas. No entanto, isso gera preocupações éticas, especialmente pelo uso intenso da IA para vigilância, levantando debates sobre privacidade e direitos humanos, que certamente continuarão nos próximos anos.
Desafios no caminho chinês
Apesar desses avanços, há alguns desafios importantes no caminho da China.
Primeiro, a dependência de semicondutores avançados, essenciais para tecnologias sofisticadas de IA. As recentes restrições americanas têm criado dificuldades consideráveis, forçando a China a buscar alternativas locais, algo complexo e lento.
Além disso, há um grande desafio na formação e retenção de talentos especializados. Mesmo formando muitos profissionais anualmente, existe um descompasso entre a oferta e demanda por talentos experientes.
Por último, existe ainda um desafio na aplicação prática das inovações tecnológicas desenvolvidas nos laboratórios, com muitas tecnologias não sendo rapidamente incorporadas na economia real.
Não há uma resposta simples sobre se a China já assumiu ou não a liderança em IA. Se olharmos investimentos, quantidade de pesquisas e velocidade de adoção doméstica, a China certamente está na frente.
Mas, se a liderança envolver inovação disruptiva, capacidade de transformar pesquisas em produtos globais e controle das tecnologias mais estratégicas, os EUA ainda parecem ter uma vantagem importante.
No final das contas, mais importante do que declarar hoje quem está na frente é entender que essa disputa ainda está acontecendo. O papel da China na IA está sendo construído, assim como o de outros países. Acompanhar de perto essa história, entendendo todas suas nuances, é o grande desafio para todos nós.
Fica a pergunta: a China já lidera a revolução da IA? A resposta, certamente, dependerá de como cada um interpreta os fatos e as dimensões envolvidas. E é exatamente esse debate que devemos continuar acompanhando.