Por Rafael Kiso, fundador e CMO da mLabs.
A influência digital deixou de ocupar as margens do mercado e passou a integrar o centro das decisões de consumo, da formação de opinião e da estratégia de marca. Não à toa, nos últimos anos, a chamada creator economy se consolidou como um modelo profissional de geração de renda para os brasileiros.
O país já conta com cerca de 20 milhões de criadores com mais de mil seguidores e, entre eles, 9 milhões já firmaram parcerias comerciais com empresas.
O criador de conteúdo, antes visto como “mídia alternativa”, passou a desempenhar um papel estratégico em campanhas publicitárias e ações de marketing.
O movimento não se limita a uma tendência de carreira, mas simboliza uma nova lógica de valor na economia. Ao transformar conhecimento, repertório e relevância online em ativos mensuráveis, os creators operam hoje como agentes econômicos capazes de gerar impacto real para marcas e comunidades.
E fazem isso com eficiência: segundo pesquisa da Opinion Box, 65% das companhias brasileiras acreditam que ações com influenciadores geram mais retorno sobre investimento do que outras iniciativas. Em um cenário onde o alcance orgânico das redes por si já não basta, eles entregam o que os anunciantes valorizam, engajamento.
A transformação abriu caminho para um novo modelo de relacionamento entre empresas e profissionais, que vai muito além do publipost tradicional. A indústria moderna se baseia em conexões contínuas e autênticas, com parcerias sustentadas por afinidade de valores e presença constante nas audiências digitais.
Em vez de ações pontuais, cresce a aposta em colaborações recorrentes, capazes de gerar identificação com o público e fortalecer a narrativa das corporações ao longo do tempo.
Com um ecossistema menos concentrado, elas conseguem acessar nichos antes inalcançáveis e atuar com maior eficácia, inclusive em ações locais e direcionadas, que valorizam a linguagem, a cultura e as especificidades de cada território.
Dados, segmentação e plataformas: o futuro da influência é descentralizado
O modelo tradicional de agenciamento publicitário, centrado em grandes nomes e nos principais centros urbanos, já não dá conta da escala e diversidade da nova dinâmica.
A cauda longa dos criadores digitais segue sendo um território inexplorado para muitas marcas, e é justamente nesse ponto que a tecnologia assume papel central.
Plataformas que conectam diretamente talentos e anunciantes estão democratizando o acesso às campanhas, gerando visibilidade e renda para perfis de nicho, inclusive fora do eixo Rio-São Paulo.
Nesse contexto, os especialistas, micro e nano influenciadores vêm ganhando espaço por sua capacidade de estabelecer conexões autênticas com audiências altamente segmentadas. Embora tenham menos seguidores, costumam registrar taxas de engajamento mais elevadas e exercer papel relevante nas decisões de compra de seus públicos.
Muitas vezes, funcionam como verdadeiros conselheiros de consumo, e com resultados comprovados: segundo o mesmo relatório da Opinion Box, 55% dos brasileiros já adquiriram produtos ou serviços por indicação de um influencer.
Esse tipo de atuação também tem se mostrado eficaz para negócios que incorporam a descentralização às suas estratégias. Ao mobilizar dezenas ou até centenas de perfis em projetos específicos, com forte conexão com realidades locais, os ganhos superam a exposição e impulsionam conversão, fidelização e fortalecimento da marca.
Em iniciativas de e-commerce, isso tem proporcionado um ROI (retorno sobre o investimento) entre 5 e 12 vezes o valor investido, sendo uma escolha inteligente em tempos de orçamentos enxutos e sobrecarga dos meios tradicionais.
Novas formas de colaboração
Uma das frentes promissoras do mercado da influência é o conteúdo gerado pelo usuário, conhecido como user generated content (UGC).
Nesse formato, corporações passam a envolver diretamente seus próprios consumidores na concepção de publicações, transformando clientes reais em embaixadores espontâneos.
Em troca de brindes, pequenos cachês ou acesso antecipado a produtos e serviços, os usuários compartilham experiências genuínas, por meio de publicações que geram identificação imediata com outros potenciais compradores.
Diferente das campanhas tradicionais, o UGC traz uma narrativa vivida, carregada de prova social e credibilidade. Além de reduzir custos, essa estratégia amplia o alcance da comunicação ao incorporar uma maior diversidade de vozes, mais próximas da audiência e, por isso mesmo, mais eficazes na construção de confiança. É uma abordagem que reforça o pertencimento e transforma a audiência em parte ativa da mensagem.
A evolução do conteúdo gerado pelo usuário passa pela consolidação dos UGC Creators, consumidores engajados que, mesmo sem grande audiência, produzem conteúdos autênticos sob orientação leve das marcas. Eles não precisam publicar o material em seu próprio perfil, pois o valor está na espontaneidade e no uso estratégico do conteúdo nos canais da empresa.
Marcas mais avançadas já estruturam programas para identificar esses criadores dentro da própria base de usuários, a partir de indicadores como NPS alto, avaliações positivas ou interações frequentes, e os capacitam com orientações simples para produzir fotos, vídeos ou depoimentos. É o que se convencionou chamar de “pescar no próprio aquário”: transformar os mais engajados em nano influenciadores internos.
E o modelo tem respaldo nos dados. Segundo levantamento da TINT, o UGC pode ser até 8,7 vezes mais eficaz do que o publipost de um macro influenciador.
Além disso, análises recentes da Dash Hudson mostram que conteúdos lo-fi, com baixa produção, estética natural e gravados em celular, apresentam desempenho superior aos hi-fi, com 40% mais visualizações e 30% mais alcance, especialmente em Reels.
Por fim, o futuro da influência não reside apenas nos grandes holofotes, mas na multiplicidade de vozes capazes de construir valor sustentado pela confiança. A habilidade de transformar repertório, propósito e proximidade em retorno mensurável redefine o marketing como um campo orientado por vínculos duradouros e autenticidade.
Criadores e marcas que compreendem deixam de atuar apenas como parceiros táticos e assumem juntos o protagonismo como agentes estratégicos, com visão de longo prazo, autonomia e capacidade concreta de impulsionar negócios, lançar produtos e consolidar comunidades.