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Do byte ao blackout: o elo perdido da transformação digital

Foto: divulgação.

Por Jamil Mouallem, sócio diretor comercial e de marketing da TS Shara.

A transformação digital está remodelando profundamente a forma como empresas operam, inovam e se relacionam com clientes.

No Brasil, esse processo tem ganhado tração não apenas nas grandes corporações, mas também em startups e negócios de médio porte que perceberam o valor estratégico da tecnologia.

Iniciativas como o Web Summit Rio, que em 2024 reuniu mais de 34 mil participantes de 102 países, reforçam o papel do país como protagonista na revolução digital da América Latina.

Porém, enquanto discutimos nuvem, 5G, inteligência artificial, blockchain e edge computing entre outras tecnologiasa, há uma variável silenciosa, frequentemente negligenciada, mas absolutamente essencial: a qualidade da energia elétrica.

Em um mundo cada vez mais interconectado, a dependência de sistemas digitais é total. Qualquer instabilidade elétrica, por menor que pareça, pode provocar falhas em servidores, desligamento de equipamentos, perda de dados e interrupção de operações críticas. Isso não é só inconveniente, é estratégico.

Oscilações elétricas, como picos de tensão, quedas momentâneas, ruídos harmônicos e surtos, ocorrem com mais frequência do que se imagina.

De acordo com o relatório da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), em 2023, o consumidor brasileiro ficou, em média, mais de 11 horas sem energia ao longo do ano, distribuídas em aproximadamente 7,5 interrupções. Esses dados, embora sejam médias, escondem realidades mais críticas em regiões específicas, especialmente onde a infraestrutura da rede elétrica é mais frágil.

Agora pense: se uma empresa está operando com automação industrial, controle remoto de processos, sensores IoT em produção e sistemas em nuvem para análise em tempo real, o impacto de uma simples oscilação pode ir muito além de uma pausa no trabalho. Estamos falando de riscos à integridade dos dados, prejuízos operacionais, desgaste de equipamentos e, em casos extremos, comprometimento de decisões de negócios.

A energia elétrica não afeta apenas a operação das empresas, mas tem um impacto direto em aspectos críticos da sociedade. Setores essenciais como hospitais, que realizam cirurgias e atendem pacientes, clínicas de saúde que armazenam vacinas, e até serviços de emergência, dependem de uma energia estável para garantir o bem-estar e a vida das pessoas. Falhas de energia nessas áreas podem colocar em risco a saúde de milhares de cidadãos.

Além disso, setores como a indústria, o varejo e processos produtivos de alta complexidade também são extremamente vulneráveis a oscilações ou quedas de energia.

Embora existam sistemas de contingência, como geradores e fontes alternativas, a continuidade e a qualidade da energia são fundamentais, não só para garantir a segurança e a operação desses serviços vitais, mas também para preservar a estabilidade econômica das empresas e da sociedade como um todo.

A dependência de uma infraestrutura energética robusta é essencial para a competitividade e a resiliência dos negócios em um cenário digital e econômico cada vez mais exigente.

A digitalização exige uma base estável. É ilusório imaginar que tecnologias de ponta possam operar eficientemente em uma estrutura energética que ainda apresenta instabilidades básicas.

Uma analogia simples ajuda: não adianta instalar o software mais moderno do mundo em um computador com disco rígido corrompido, a performance será comprometida desde o primeiro clique.

A transformação digital requer não apenas conectividade e processamento, mas também resiliência energética. Isso significa investir em sistemas de proteção elétrica, redes inteligentes (smart grids), soluções de armazenamento de energia e uso de fontes alternativas como solar e eólica, que vêm ganhando força especialmente entre empresas com visão ESG.

Muitas vezes, o debate sobre energia está restrito aos setores de infraestrutura ou manutenção. Mas, em um cenário digitalizado, todos os setores são impactados. Um servidor que reinicia subitamente por uma queda de energia pode derrubar um sistema ERP inteiro.

Um equipamento de automação que sofre desgaste por picos de tensão pode reduzir a eficiência da produção. Até mesmo o marketing, que depende de plataformas digitais em tempo real, pode ver suas campanhas prejudicadas se os sistemas caírem.

Isso mostra que a energia, embora invisível, está no centro da operação moderna. E mais: que a qualidade da energia elétrica é um tema que precisa sair das salas técnicas e entrar nas estratégias corporativas.

Eventos como o Web Summit Rio, que traz tendências e inovações, nos lembram que estamos caminhando para um mundo cada vez mais exigente em termos de infraestrutura digital.

A IA generativa, por exemplo, depende de data centers robustos e em constante funcionamento. O 5G, com sua latência ultrabaixa, precisa de continuidade energética para manter a performance. A indústria 4.0, por sua vez, opera em ambientes que não podem parar nem por milissegundos.

Tudo isso nos leva a uma conclusão: o sucesso da transformação digital depende da confiabilidade da energia. E isso exige planejamento, investimento e, acima de tudo, consciência sobre o papel estratégico da energia elétrica nas decisões tecnológicas.

A transformação digital não começa na nuvem. Ela começa na tomada elétrica. A inovação que queremos alcançar, com mais inteligência, velocidade e impacto, precisa de um alicerce robusto, e esse alicerce é a energia. Estável, limpa e confiável. É ela que alimenta os servidores, os sensores, os sistemas, os dados… e, no fim do dia, as decisões.

Falar de energia elétrica pode não ser tão glamouroso quanto discutir inteligência artificial ou metaverso. Mas é, sem dúvida, essencial. Porque no jogo da inovação, não vence quem brilha mais. Vence quem consegue manter as luzes acesas, sempre.

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