Por Matheus Martins, sócio do Barcelos Martins Advogados.
Durante décadas, a advocacia empresarial se manteve fiel a um modelo reativo, com serviços pontuais, cobranças por hora e pouca integração ao dia a dia das empresas.
No entanto, à medida que o ambiente de negócios se torna mais dinâmico, complexo e orientado por dados, esse formato começa a revelar suas limitações. Custos imprevisíveis, respostas lentas e a ausência de um acompanhamento contínuo colocam em xeque a eficácia da abordagem tradicional diante das demandas de empresas que precisam tomar decisões rápidas, seguras e embasadas juridicamente.
Essa inquietação tem impulsionado a busca por alternativas mais eficazes e alinhadas à realidade das organizações, e é nesse contexto que o modelo Jurídico as a Service (JaaS) ganha relevância.
Inspirado na lógica de serviços recorrentes, já consolidada em setores como tecnologia e marketing, o JaaS propõe uma mudança cultural profunda: transformar o jurídico de um centro de custos imprevisíveis para um pilar estratégico e contínuo de suporte à tomada de decisões.
Segundo a pesquisa 2024 Legal Department Operations Index, da Thomson Reuters, o volume de demandas jurídicas de empresas e departamentos jurídicos continua a crescer para 79% dos entrevistados e o controle de custos é mais fundamental do que nunca, com 84% dos entrevistados considerando-o uma prioridade máxima, ao mesmo tempo em que dois terços dos departamentos não estão aumentando o número de advogados e mais da metade não está aumentando os seus orçamentos.
Esses dados reforçam essa demanda crescente por soluções jurídicas mais inovadoras, acessíveis e permanentes, muitas vezes chamados de Acordos de Honorários Alternativos (Alternate Fee Arrangements), que oferecem estruturas de preços que vão além do modelo tradicional de cobrança por hora e podem incluir honorários fixos, honorários limitados, honorários de contingência e acordos híbridos, proporcionando aos clientes um orçamento mais previsível e potencialmente maior valor para seus serviços jurídicos.
Para empresas de pequeno e médio porte, que muitas vezes operam com estruturas enxutas e orçamentos limitados, a previsibilidade de custos é mais do que um diferencial, é uma necessidade.
Ao substituir a cobrança por hora para modelos fixos ou por assinatura, o JaaS oferece previsibilidade, agilidade e foco em prevenção. Isso permite que o jurídico seja planejado como um custo fixo e se integre de forma mais orgânica à operação da empresa.
A atuação jurídica passa a ser constante, antecipando riscos em vez de apenas reagir a eles. Para os escritórios, os benefícios também são evidentes.
A receita recorrente proporciona maior estabilidade financeira, enquanto a relação contínua com os clientes favorece entregas mais personalizadas e estratégicas. Mais do que prestadores de serviço, os advogados se tornam verdadeiros conselheiros de negócio.
Essa transformação, no entanto, traz desafios importantes. Muitos advogados ainda resistem à mudança, receosos de perder rentabilidade ou lidar com maior carga de trabalho. O modelo recorrente exige uma entrega contínua de valor, o que demanda mais organização, previsibilidade e uma atuação mais próxima e estratégica junto ao cliente.
Além disso, há uma curva de aprendizado: é necessário adaptar estruturas, fluxos e processos internos, além de desenvolver novas competências, como visão de negócio e proatividade. Apesar disso, quem supera essa fase inicial tende a se destacar com maior fidelização, receita previsível e relevância no mercado.
Apesar disso, o movimento é irreversível. O avanço do JaaS evidencia uma mudança estrutural no mercado jurídico: de um modelo pautado na escassez e na imprevisibilidade para um modelo baseado em confiança, parceria e resultados mensuráveis. A advocacia empresarial moderna exige flexibilidade, visão estratégica e compromisso com o sucesso do cliente.
A pergunta, portanto, não é se o JaaS vai se consolidar, mas quais escritórios e profissionais estarão preparados para liderar essa transformação. O futuro da advocacia já começou, e ele é colaborativo, recorrente e orientado por valor.