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A diferença entre gamificação construtiva e exploradora

Foto: divulgação.

Por Samir Iásbeck, CEO e fundador do Qranio.

Em meu trabalho com educação corporativa, vejo diariamente o poder transformador da gamificação quando aplicada com propósito. Os números não mentem: segundo levantamentos internos de nossas plataformas, 83% dos funcionários se sentem mais motivados ao participar de treinamentos gamificados, enquanto 89% afirmam que essa metodologia tem impacto positivo direto em sua produtividade. Isso acontece porque a gamificação construtiva ativa os mesmos circuitos de recompensa do cérebro que os jogos tradicionais, mas com um propósito fundamental: gerar valor real para o usuário através do desenvolvimento de habilidades e conhecimentos aplicáveis.

Um exemplo concreto: uma empresa do setor financeiro implementou nossa plataforma de gamificação para treinamentos sobre educação financeira e, em apenas três meses, registrou redução de 27% nos casos de colaboradores com problemas de endividamento. A mesma neurociência que as apostas usam para viciar, nós aplicamos para educar e transformar.

Trazendo para o contexto atual, vivemos uma verdadeira “epidemia” de jogos de apostas que tem afetado negativamente milhares de pessoas e suas famílias. Aqui está a diferença fundamental: enquanto a gamificação educacional visa o desenvolvimento humano, as apostas online visam exclusivamente a extração de valor financeiro do usuário.

Como desenvolvedor de tecnologia, posso afirmar categoricamente: a matemática não mente. O jogo é programado para que a casa sempre ganhe no final. Não existe estratégia que funcione a longo prazo. Não existe “hora certa” para jogar. Não existe “sequência de apostas” que garanta a vitória. É tudo programado para você perder. (entenda isso de uma vez!)

Histórias reais: quando o jogo vira pesadelo

Janaína, confeiteira de 35 anos de Guarulhos, perdeu R$1.400 em poucas horas jogando tigrinho. Era o dinheiro do aluguel da família. “Ainda não me sinto bem. É como se faltasse um pedaço de mim”, conta ela, que hoje administra um grupo de apoio para jogadores compulsivos.

Roberta, cuidadora de idosos de 42 anos, começou a apostar durante seu tratamento de câncer. “Eu pensava: se a pessoa está ganhando, será que eu não vou ganhar? E aí você joga. E fica cega. Eu jogava o dia inteiro”, relembra.

Já Emanuela, de 25 anos, chegou ao ponto de quebrar o próprio celular para parar de jogar. “Tive abstinência, com dores de cabeça, calafrio e enjoo. Chegou em um momento que pensei em fazer besteira porque eu me vi de fato desesperada”, conta a jovem, que hoje faz tratamento com um psiquiatra.

Infelizmente, essas histórias não são exceção. Em grupos de apoio para viciados em apostas (algo que também aumenta a cada dia), há relatos de pessoas que perderam até R$200 mil, que fizeram dívidas com agiotas e que usaram dinheiro da família para tentar recuperar perdas.

A engenharia da dependência

Como especialista em design de plataformas digitais, posso afirmar que as empresas de apostas sabem exatamente o que estão fazendo. Elas usam técnicas avançadas para manter você jogando:

  • Bônus de boas-vindas que parecem vantajosos, mas têm regras complicadas
  • Pequenas vitórias programadas para te dar a falsa sensação de que está no lucro
  • Notificações constantes para te chamar de volta ao jogo
  • Influenciadores famosos que só mostram quando ganham, nunca quando perdem
  • Acesso 24 horas por dia, direto no seu celular

Enquanto isso, plataformas de gamificação educacional utilizam mecanismos semelhantes de engajamento – desafios, recompensas, feedback imediato – mas com um propósito completamente diferente: desenvolver habilidades, promover aprendizado e gerar resultados positivos mensuráveis para indivíduos e organizações.

A Dra. Anna Lembke, psiquiatra da Universidade de Stanford, explica: “As corporações que possuem e operam sites de jogos de azar online intencionalmente minam os esforços dos jogadores viciados para se recuperarem. Elas bombardeiam pessoas vulneráveis com centenas de mensagens promocionais, que por si só servem como gatilho para recaídas”.

O poder da escolha está em suas mãos

A tecnologia em si não é boa nem má – o que determina seu impacto é o propósito com que é aplicada. Quando usamos gamificação para educar, capacitar e desenvolver pessoas, criamos ciclos virtuosos de crescimento. 

Quando a mesma tecnologia é aplicada para extrair valor financeiro sem entregar benefício real, criamos ciclos viciosos de dependência. Compartilhe este artigo. Pode ser a diferença entre alguém perder tudo ou começar a reconstruir sua vida financeira. E se você é gestor ou líder, considere como a gamificação construtiva pode ser aplicada em sua organização para promover aprendizado significativo e hábitos saudáveis entre seus colaboradores.

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