Por Otavio Boari, CEO do UaiRango.
Desde 2024, o valor agregado dos ecossistemas de startups no mundo registra uma queda significativa, de 31%, reflexo de uma desaceleração no volume de investimentos, nas saídas (exits) e na reciclagem de capital. Embora preocupante à primeira vista, essa retração não deve ser encarada como um retrocesso definitivo, mas sim como um momento de ajuste em um mercado que, desde 2019, mantém um crescimento anual composto de 11% — quase quatro vezes superior à média das economias globais. Ou seja, estamos diante de uma consolidação e amadurecimento dos ecossistemas, que exigem novas estratégias para continuar avançando.
Um dos fatores que mantém a chama da inovação acesa é o setor de inteligência artificial (IA) e big data, que não apenas continua em expansão, mas acelera seu ritmo de crescimento. Em 2024, startups desse segmento absorveram 40% do investimento de venture capital, um salto significativo em relação aos 26% de 2021. Além disso, ecossistemas globais emergentes, como Paris, Delhi, Istambul e San Diego, dobraram o número de startups nativas de IA nos últimos três anos, enquanto cidades como Toronto e Shenzhen viram seus financiamentos para IA se multiplicarem por mais de dez vezes.
No cenário latino-americano, o Brasil mantém sua posição de destaque, especialmente São Paulo, que segue como o principal ecossistema da região, embora tenha sofrido uma retração de 45% no valor total, a maior entre todas as regiões globais, e tenha caído para a 37ª posição no ranking global. Apesar disso, o país se sobressai na geração de hubs regionais emergentes, como Florianópolis e Recife, que despontam como modelos de inovação focada em tecnologia e desenvolvimento sustentável — um sinal claro de que o potencial local ainda é forte e diversificado.
O relatório do Global Startup Ecosystem Report 2025 indica que, para reverter essa desaceleração e capturar valor nos próximos anos, o Brasil e outros países latino-americanos devem seguir três caminhos estratégicos. Primeiramente, a aposta na IA como uma oportunidade para “saltar etapas” no desenvolvimento tecnológico, desde que acompanhada por políticas públicas eficazes, investimentos adequados e capacitação de talentos. Segundo, o fortalecimento do capital local, com a consolidação de fundos regionais que diminuam a dependência do capital estrangeiro e promovam um ciclo sustentável de investimentos.
O que se percebe, portanto, é que o mercado de startups, embora passe por uma fase de ajustes, ainda mantém uma dinâmica de crescimento e transformação, especialmente guiada pela tecnologia de ponta e pela adaptação às demandas regionais. Para países como o Brasil, que enfrentam desafios específicos de mercado e infraestrutura, a capacidade de unir inovação tecnológica com soluções reais e contextualizadas será o diferencial para atravessar esse momento e conquistar espaço no cenário global.
A desaceleração atual não deve ser vista como um fracasso, mas como um convite para reflexão e ação estratégica. O futuro dos ecossistemas de startups, principalmente na América Latina, dependerá da habilidade de transformar desafios em oportunidades, capitalizar sobre a revolução da inteligência artificial e fortalecer uma base financeira local resiliente. Somente assim será possível manter o ritmo de inovação e garantir que o potencial desse setor seja plenamente realizado.