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Mercado trata consultores de tecnologia como operários e compromete resultados

Foto: divulgação.

Por Éric Machado, CEO da Revna Tecnologia.

Durante décadas, o mercado de tecnologia buscou profissionais estratégicos, especialistas e líderes, mas muitas vezes continuou tratando-os como simples executores de tarefas. Essa distorção ainda persiste em diversas consultorias e departamentos de TI, que operam com uma lógica de produção padronizada mais voltada para controle e escala do que para valorização intelectual. Nesse modelo, consultores acabam sendo vistos como recursos facilmente substituíveis, em vez de reconhecidos como ativos críticos para o sucesso de projetos complexos e estratégicos.

Mesmo quando contratam profissionais sêniores e certificados, muitas empresas impõem modelos de gestão baseados em controle rígido, padronização excessiva e silenciamento de opiniões técnicas. Esses profissionais são alocados, orientados e monitorados como operários em linha de produção com atividades repetitivas, sem espaço para julgamento próprio ou pensamento estratégico. Há, no entanto, um ponto crucial que frequentemente passa despercebido: projetos complexos não se resolvem apenas com execução disciplinada. Eles exigem visão crítica, experiência aplicada e liberdade para pensar soluções além do padrão.

Relatórios de mercado comprovam essa realidade e revelam seus efeitos práticos. Segundo o State of the Developer Nation 2024, 64% dos profissionais de tecnologia relatam falta de autonomia em projetos. Na prática, isso significa decisões tomadas por gestores distantes do problema técnico real, que ignoram os insights de quem está na execução, criando soluções superficiais e falhas recorrentes.

Já a pesquisa da Harvard Business Review indica que 72% dos líderes de TI percebem menor engajamento das equipes justamente pela ausência de liberdade técnica, o que aumenta o turnover e reduz a qualidade. Em outras palavras, profissionais deixam de se comprometer com o sucesso do projeto quando suas contribuições são sistematicamente desconsideradas. Buscam, assim, ambientes mais abertos ou abandonam o setor corporativo para empreender ou atuar como consultores independentes.

O Project Management Institute reforça a gravidade do cenário ao apontar que 60% dos projetos de TI falham por falhas humanas, como comunicação ineficaz, decisões mal informadas e subaproveitamento de especialistas. Esses números demonstram que o problema não é técnico, mas estrutural. Ao restringir a atuação consultiva e o pensamento crítico, empresas reduzem drasticamente sua capacidade de prevenir erros, adaptar soluções e inovar.

Essa distorção impacta diretamente a retenção de talentos. Segundo o LinkedIn Workforce Confidence Index, 78% dos profissionais sêniores preferem ambientes onde podem opinar e influenciar decisões. Esse dado explicita que a fuga de talentos não ocorre por mera insatisfação salarial ou carga de trabalho, mas pela sensação de inutilidade intelectual. Esses profissionais não querem apenas um crachá. Querem impacto real, respeito e autonomia para exercer sua expertise.

No Brasil, o problema é ainda mais crítico. Dados da Brasscom (2024) mostram que o país ocupa a terceira posição mundial em déficit de profissionais estratégicos em TI, apesar do crescimento na formação técnica. Ou seja, formar mais profissionais não resolve o problema se as empresas continuarem tratando especialistas como meros executores. É preciso criar estruturas que absorvam e potencializem suas capacidades estratégicas, não podemos castrar o processo criativo dos melhores talentos.

A transformação desse cenário exige mudança de mentalidade. Consultoria não é commodity, cada projeto é único, e o diferencial competitivo está nas pessoas capazes de navegar a complexidade com clareza e responsabilidade. O maior risco não está em investir em um consultor experiente, mas em subestimar seu valor e falhar por falta de pensamento crítico. Empresas que continuam enxergando esses profissionais como custos a serem contidos, e não como parte estratégica dos projetos, acabam comprometendo resultados, inovação e sua própria capacidade de competir.

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