Com a digitalização dos processos de recrutamento, muitos profissionais têm seus currículos descartados antes mesmo de chegarem às mãos de um avaliador humano. O motivo? A linguagem usada no documento.
Segundo Virgilio Marques dos Santos, sócio-fundador da FM2S Educação e Consultoria, gestor de carreiras e PhD pela Unicamp, o uso incorreto de termos pode fazer com que o currículo “não fale a língua” dos sistemas automatizados que fazem o primeiro filtro nos processos seletivos.
“Hoje, quem rejeita seu currículo, na maior parte das vezes, é uma máquina. E, se você não usar as palavras certas, ela simplesmente ignora o seu perfil, independentemente da sua formação ou experiência”.
Os sistemas chamados de Applicant Tracking Systems (ATS) funcionam como leitores automáticos que escaneiam os currículos em busca de palavras-chave. Se o documento não contiver os termos corretos, geralmente extraídos da descrição da própria vaga, o candidato é automaticamente excluído do processo.
“Não basta ter pós-graduação, experiência internacional ou saber três idiomas. Se o seu currículo não mencionar exatamente o que a vaga pede, como ‘gestão de projetos’ ou ‘análise de dados’, por exemplo, as chances de ser descartado são enormes”.
Segundo dados da plataforma americana Jobscan, palavras-chave como “gestão de equipe”, “Lean Six Sigma”, “indicadores de performance”, “atendimento ao cliente” e “Power BI” estão entre as mais bem ranqueadas em processos seletivos automatizados.
“A recomendação é que o profissional ajuste seu currículo para cada vaga, espelhando os termos usados pelas empresas. Um currículo bem escrito, com as palavras certas, pode aumentar em até 80% as chances de o candidato ser chamado para entrevista, de acordo com estudos da própria Jobscan”.
Segundo ele, currículo não é apenas um relato de experiências, mas uma ferramenta estratégica.
“Um bom currículo hoje não é aquele que mostra tudo o que você já fez, mas o que mostra o que o mercado quer ver, com verdade, precisão, contexto e a terminologia certa”.
Além de personalizar o conteúdo, o especialista recomenda atenção ao título do currículo, que deve ser objetivo e direcionado. Termos genéricos como “profissional versátil” ou “em busca de novos desafios” não agregam.
“Um título como ‘analista de processos com foco em melhoria contínua e Lean Six Sigma’ comunica com muito mais clareza e impacto”.
Na avaliação de Virgilio Marques dos Santos, a dificuldade em ser notado por recrutadores não está necessariamente ligada à qualificação dos candidatos, mas à capacidade de traduzir essa experiência na linguagem dos processos seletivos atuais.
“Hoje, ser competente é pré-requisito. O diferencial está em saber como comunicar essa competência de forma estratégica. Não se trata de inflar o currículo, mas de aprender a moldá-lo para cada contexto, como quem escreve um texto pensando no leitor certo”, conclui.
Com a automação crescente no recrutamento e seleção, ele reforça: entender os filtros do sistema pode ser o que separa um candidato ignorado de um convocado para entrevista.