Por Matheus Martins, sócio do Barcelos Martins Advogados.
A transformação digital está promovendo mudanças profundas no setor jurídico, rompendo com práticas tradicionais e impulsionando uma nova forma de atuação alinhada às exigências de um mercado cada vez mais dinâmico e competitivo.
A chamada “Advocacia 4.0” representa um verdadeiro novo paradigma na prestação de serviços jurídicos, orientado para a entrega de valor com foco em eficiência mensurável, previsibilidade e resultados concretos para os clientes.
Essa evolução redefine o papel do profissional do Direito, tornando-o um parceiro estratégico que contribui diretamente para os objetivos de negócio, ao invés de atuar apenas de forma reativa.
Modelos de contratação como o secondment, que posiciona advogados temporariamente dentro das empresas, e o modelo de risco, que vincula remuneração ao êxito do caso, não são meras variações contratuais.
Funcionam como mecanismos de alinhamento de incentivos entre prestador e cliente, corrigindo distorções históricas do faturamento por hora, prática frequentemente associada à imprevisibilidade de custos e à desconexão com resultados de negócio.
Quanto maior a pressão por performance e otimização orçamentária, maior a tendência de migração para formatos que estabeleçam relação direta entre pagamento e entrega de valor.
A automação de tarefas repetitivas, a análise avançada de dados e o uso de inteligência artificial têm redefinido fluxos de trabalho. Ferramentas capazes de examinar milhares de documentos em minutos, gerar minutas de peças processuais ou conduzir due diligences complexas ampliam a capacidade de resposta e reduzem gargalos operacionais.
A consequência prática é que recursos humanos podem ser direcionados para atividades de maior valor estratégico, como negociação, gestão de riscos e formulação de teses jurídicas. Em mercados de alta velocidade, resistir à adoção dessas tecnologias equivale a aceitar um atraso competitivo permanente.
O avanço das lawtechs e legaltechs acelera essa transformação. Ao oferecer soluções como jurimetria, gestão de processos, mediação online e compliance automatizado, essas empresas democratizam o acesso ao Direito e expandem as possibilidades de atuação de escritórios e departamentos jurídicos.
Esse movimento acompanha o avanço do ecossistema de inovação brasileiro, que hoje conta com aproximadamente 13 mil startups, segundo relatório da Associação Brasileira de Startups (Abstartups), com maior concentração na região Sudeste (55,8%), seguida pelo Sul (22,1%) e Nordeste (12,3%).
A integração entre tecnologia e prestação de serviços jurídicos tende a consolidar-se como norma de mercado, e a ausência dessa integração significa perda de eficiência, de escalabilidade e de aderência às expectativas do cliente moderno. A função jurídica também vem se deslocando de um papel reativo para uma atuação preventiva e estratégica.
Em setores regulados ou de rápida inovação, onde riscos legais e reputacionais são elevados, a capacidade de antecipar problemas e influenciar decisões antes que litígios ocorram é decisiva para a sustentabilidade do negócio.
Por isso, a formação de alianças entre escritórios, consultorias e empresas de tecnologia tornou-se um diferencial competitivo, ao combinar expertise jurídica com conhecimento em ESG, inovação, finanças e governança corporativa.
Persistem, contudo, desafios significativos, onde barreiras culturais e resistência à mudança retardam a adoção plena das inovações.
Questões éticas e regulatórias ligadas ao uso de inteligência artificial em que a ausência de diretrizes claras pode comprometer a confiabilidade das soluções, enquanto a regulamentação excessivamente restritiva pode sufocar avanços que aumentam a eficiência e ampliam o acesso à Justiça.
O movimento em direção à Advocacia 4.0 não é uma transformação estrutural que redefine o papel do serviço jurídico no mercado contemporâneo.
A tecnologia, os novos modelos contratuais e a integração multidisciplinar configuram-se como elementos indispensáveis para garantir eficiência, competitividade e alinhamento com as demandas empresariais atuais.
Ignorar essa realidade significa comprometer a sustentabilidade e a relevância do setor jurídico diante de um ambiente cada vez mais dinâmico e exigente.
Assim, a adoção plena dessas mudanças deixa de ser uma escolha estratégica para se tornar uma necessidade imperativa para escritórios e departamentos jurídicos que buscam permanecer relevantes e competitivos no século XXI.