Se 2022 foi o ano do quiet quitting, a onda global de profissionais que passaram a fazer apenas o mínimo necessário para preservar a saúde mental, 2025 marca a ascensão de um termo ainda mais preocupante: o quiet cracking, ou “rachadura silenciosa”.
De acordo com Virgilio Marques dos Santos, sócio-fundador da FM2S Educação e Consultoria, gestor de carreiras e PhD pela Unicamp, a expressão representa o ponto de ruptura emocional e profissional a que muitos trabalhadores chegaram após anos de sobrecarga, medo e insegurança no ambiente corporativo:
“O quiet cracking não é mais uma escolha de desconexão, como o quiet quitting foi. É o colapso que vem quando o elástico é esticado demais por tempo demais, e finalmente arrebenta”.
Quando o corpo e a mente dizem basta
De acordo com o especialista, o quiet cracking surge da combinação perigosa de alta pressão por resultados, insegurança no emprego e liderança despreparada para lidar com o emocional das equipes:
“Normalizamos o insustentável. Profissionais estão acumulando funções de colegas demitidos, convivendo com o medo constante de cortes e, ainda assim, tentando entregar mais com menos. Isso tem um preço, e ele começa a ser cobrado agora”.
Entre os sintomas mais recorrentes estão irritabilidade, explosões emocionais, crises de ansiedade, queda na qualidade das entregas e isolamento social. Nas equipes, o reflexo aparece em conflitos constantes, clima tenso e comunicação passivo-agressiva — sinais de que algo profundo está se rompendo.
“O profissional não está simplesmente desmotivado. Ele está em colapso, ainda que silencioso. E, muitas vezes, nem ele percebe o tamanho da rachadura até que seja tarde demais”, observa.
Um alerta para líderes e empresas
Ele destaca que o problema não é apenas individual, mas organizacional:
“Não dá mais para tratar o esgotamento como fragilidade pessoal. A rachadura é sistêmica. É uma falha na cultura de trabalho, na forma como lideramos e equilibramos demandas”.
Ele aponta quatro principais causas do quiet cracking:
- A cultura do “faça mais com menos”, intensificada após sucessivas rodadas de demissões;
- O burnout crônico, que deixou de ser exceção e virou estado permanente;
- O medo e a incerteza, que fazem profissionais suportarem situações abusivas;
- A liderança despreparada, focada em métricas e não em pessoas.
“Empresas que continuam ignorando a fadiga coletiva estão corroendo a base da produtividade. Ninguém entrega qualidade à beira do colapso”, alerta.
Como prevenir a ruptura silenciosa
Para conter o avanço da rachadura, o especialista defende que líderes e profissionais compartilhem a responsabilidade. Ele recomenda práticas simples e imediatas, como reconhecer sinais de exaustão, impor micro-limites e criar espaços de diálogo psicológico seguro nas equipes.
“Um gestor que pergunta ‘como posso te ajudar a ter uma semana mais equilibrada?’ faz mais pela saúde mental do time do que qualquer programa de benefícios”, reforça.
Ele também defende que a prevenção vá além de oferecer terapia:
“É preciso reconstruir a cultura de trabalho. Isso significa reavaliar prazos, proteger as equipes e entender que o bem-estar é uma condição para o resultado, não um luxo”, conclui.