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A mente do achismo e a cultura de dados: o maior obstáculo invisível das empresas

Foto: divulgação
Foto: divulgação

No Brasil, a discussão sobre transformação digital costuma começar pela tecnologia, passando por temas em alta como inteligência artificial, machine learning, automação, big data. Mas quem trabalha no cotidiano das empresas sabe: o maior obstáculo não está nos sistemas, mas nas pessoas, e, sobretudo, naquilo que chamamos de “mente do achismo”.

Muitas organizações brasileiras acreditam que já são data-driven porque possuem dashboards, contratam consultorias ou implementam alguma ferramenta de BI, mas, nos bastidores, decisões importantes continuam sendo guiadas por intuições, percepções pessoais ou hierarquias rígidas. Infelizmente, a opinião do líder ainda pesa mais do que a evidência, e isso pode ter um custo alto a longo prazo..

O World Digital Competitiveness Ranking do IMD mostra que o Brasil está entre os últimos colocados em “agilidade na tomada de decisão baseada em dados”. Não por falta de informação, pelo contrário: nunca produzimos tantos dados, mas o problema é que eles raramente chegam ao centro das decisões estratégicas como indicadores..

Uma pesquisa recente da AWS evidencia esse paradoxo: 81% dos executivos brasileiros afirmam que decisões baseadas em dados são superiores, mas apenas 23% dizem utilizá-las de forma consistente. É mais ou menos como dirigir um carro de última geração olhando pelo retrovisor, o que não falta é tecnologia, falta uma mentalidade que permita que ela faça diferença.

Esse desalinhamento cultural é tão profundo que a Harvard Business Review já alertou: 70% das iniciativas de transformação orientada a dados falham por fatores humanos e culturais, não técnicos. Isso explica por que empresas com excelentes plataformas de BI, times competentes e dados abundantes continuam tomando decisões por “feeling”. Não é ignorância, é hábito aliado ao conforto e comodidade. E também, existe o medo de ser confrontado por métricas que trazem um diagnóstico mais transparente, e às vezes menos conveniente.

O impacto é sentido diretamente no desempenho: estudos da McKinsey mostram que organizações verdadeiramente data-driven chegam a ser 23 vezes mais propensas a conquistar novos clientes e nove vezes mais propensas a retê-los. Já empresas que insistem na intuição sofrem com retrabalho, estratégias mal calibradas e baixa produtividade, uma triste realidade que, infelizmente, ainda marca a cultura corporativa brasileira quando o assunto é planejamento estratégico..

E isso não significa abandonar completamente a intuição, até porque, ela é  experiência condensada, mas ela precisa ser um ponto de partida, nunca o ponto final das decisões. As empresas mais inovadoras do mundo constroem suas decisões como cientistas: levantam hipóteses, testam, medem, validam, ajustam, num ciclo de aprendizado constante, onde os dados não engessam, mas libertam.

A mudança que o Brasil precisa não começa com mais tecnologia, mas com mais coragem cultural, com  líderes que reconheçam que não precisam saber tudo e muitas vezes vão precisar perguntar, pesquisar e validar. Precisamos de mais coragem para substituir o “eu acho” pelo “vamos medir” e “ comprovar”. Precisamos transformar dados em estratégia, e não apenas em relatórios no fundo da gaveta.

O país já tem talentos extraordinários em engenharia, analytics e IA, tem hubs de inovação relevantes, startups de classe global e um ecossistema que cresce a cada ano, o que falta, agora, é virar a chave para o que realmente importa: construir ambientes onde a evidência vence o ego, e a informação vence a hierarquia.

Este é o desafio, e também a nossa maior oportunidade!

Se o Brasil quiser prosperar na economia digital, precisará trocar a cultura do achismo por uma cultura de aprendizagem, e essa mudança não começa na tecnologia, mas na mentalidade, na cultura e na forma como fazemos nossos planejamentos estratégicos. Nos próximos encontros por aqui, vamos seguir aprofundando essa conversa, trazendo dados, análises e o que a ciência tem mostrado sobre como empresas podem evoluir de fato.

Afinal, é impossível competir no século XXI olhando para o passado, e mais impossível ainda, inovar tomando decisões no escuro.

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CEO e fundador da HorusBI, cientista de dados, especialista em BI e transformação digital.

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