Por Lilian Carvalho, criadora da Lumière, dedicada a oferecer treinamentos in-company para grandes empresas.
A musa fitness Gracyanne Barbosa parou a internet ao anunciar sua suposta marca de ovos “de luxo”, a Gracyovos, com direito a embalagem premium em veludo azul‑royal e um logo dourado. A narrativa incendiou as redes sociais e chegou a pautar a imprensa, em mais um capítulo da tendência que borra as fronteiras entre o real e o fake.
Algum tempo depois, veio a revelação: a marca não existia. Tudo fazia parte de uma ação publicitária do Canva Brasil, que criou a identidade visual e o storytelling da Gracyovos usando Inteligência Artificial (IA). A reviravolta transformou o caso em vitrine da campanha “Faz Bonito”, na qual o Canva vem explorando ícones da cultura pop brasileira — como Xuxa e agora Gracyanne — para reforçar a promessa de que qualquer pessoa pode criar sua própria marca com poucos cliques.
O “plot twist” gerou mais de 5 mil menções nas redes sociais, segundo dados da Polis Consulting. A maioria foi neutra (76%), mas as opiniões se dividiram: 12% positivas e 12% negativas. Entre os elogios, a criatividade da ação e sua capacidade de viralizar foram destaque. Já as críticas questionam o teor “enganoso” da campanha.
Esse tipo de stunt revela bem o momento do marketing digital brasileiro, que para ser visto aposta no vale tudo, como criar universos fictícios que flertam com a realidade, exploram memes pré-existentes (como o histórico “como 40 ovos por dia” de Gracyanne) e usam o corpo da influenciadora como ativo simbólico de disciplina, performance e consumo fitness. Dentro do mercado, muitos se perguntam se essa abordagem pode se tornar um “tiro no pé”.
Do ponto de vista estratégico, um alerta acendeu. Até que ponto vale arriscar a confiança do público quando “mais uma publi genial” depende de que ele acredite, ainda que por algumas horas, em uma marca que nunca existiu?
O caso Gracyovos é mais do que uma ação criativa, é um espelho do marketing digital atual, onde a busca por viralização desafia os limites entre verdade e ficção. Estratégias que constroem universos fictícios, exploram memes e se apoiam em símbolos culturais podem gerar engajamento massivo, mas também levantam questões sobre transparência e credibilidade.
Em um cenário saturado de campanhas que disputam segundos de atenção, a linha entre genialidade e desgaste é cada vez mais tênue. E, pelo menos desta vez, a mentira correu longe.