Por Antonio Mazzucco, sócio da Mazzucco&Mello Sociedade de Advogados.
O planejamento familiar é bastante útil para maximizar os benefícios de uma operação de aquisição (M&A) em sociedades sob controle familiar.
A integração estratégica do planejamento sucessório com uma operação de M&A permite às famílias empresárias otimizar o valor do ativo para todos os envolvidos.
Isso é alcançado por meio da definição de um plano sucessório robusto e de uma estrutura de governança que assegure o alinhamento das próximas gerações com a gestão dos ativos operacionais.
A ausência de tal planejamento resulta em riscos sistêmicos: a morte ou o afastamento de um sócio pode deflagrar conflitos societários entre herdeiros, bem como a ausência de um plano sucessório que assegure a continuidade operacional da empresa.
Um plano sucessório bem estruturado (holding, acordos de sócios, governança, testamentos) assegura que a atividade empresarial não tenha solução de continuidade, preservando o valor e o crescimento da atividade.
Estrutura e governança na empresa familiar
Empresas familiares têm uma dinâmica própria, caracterizada pela interseção entre negócios e relações pessoais, o que exige uma estrutura jurídica e de governança bem definida para evitar conflitos e garantir sustentabilidade no longo prazo.
Geralmente, a governança de uma sociedade familiar se estrutura em torno de um Conselho de Família, Conselho de Administração e/ou Gestão Executiva e Operações.
A base de toda a estrutura reside na família como detentora do patrimônio. É fundamental esclarecer que essa definição abrange apenas os membros que detêm a qualidade jurídica de sócios ou acionistas da empresa, ou seja, os que detêm quotas ou ações da empresa.
Estes são os que possuem efetivamente direitos patrimoniais (como participação nos lucros e recebimento de dividendos) e direitos políticos (como votar em assembleias e participar de decisões estratégicas).
Em contrapartida, temos os demais membros da família, que não têm participação no patrimônio empresarial, mas fazem parte da “família” em sentido amplo. Esses são os filhos, cônjuges e netos,que não têm quotas ou ações. Na ordem natural das coisas, esses membros passarão a ser titulares patrimoniais por sucessão.
Embora o interesse na gestão possa ou não se manifestar a partir da segunda geração, juridicamente todos os herdeiros diretos adquirirão direitos patrimoniais na exata medida da sucessão.
O desafio estratégico, portanto, reside em conciliar a relativa rigidez da regra jurídica da sucessão com a manutenção e a preservação do negócio em si.
A separação entre propriedade e gestão
Esse desafio é uma realidade comum hoje: fundadores e sócios buscam garantir a continuidade empresarial e a sucessão patrimonial, sem abrir espaço para que os herdeiros assumam a gestão do negócio e prevenindo disputas. O segredo é separar a propriedade (quem detém patrimônio) da gestão (quem conduz o negócio).
Do ponto de vista prático e jurídico, isso é implementado por meio da criação de holdings patrimoniais (que concentram imóveis e o patrimônio da família) e holdings operacionais (que abrigam a empresa-alvo para venda).
Desta forma, na operação de M&A, o comprador adquire apenas a participação na holding operacional, sem se expor a discussões familiares ou a ativos que não são de interesse do negócio.
Este modelo traz clareza e eleva a atratividade do negócio, ao mesmo tempo em que assegura uma fonte de receita para a família, proveniente da propriedade de outros ativos.
Instrumentos de governança e redução de riscos
Um instrumento essencial para conciliar os interesses da família e dos sucessores é o Protocolo de Família. Trata-se de um documento pactuado entre os membros da família empresária (sócios e herdeiros diretos).
O objetivo desse documento é regular a relação entre família, patrimônio e empresa, prevenindo conflitos futuros.
Esse documento estabelece um código de conduta da família empresária, formalizando regras de convivência, sucessão e participação.
Entretanto, o protocolo em si não tem força de lei quando isolado, mas pode e deve ser incorporado a instrumentos jurídicos vinculantes que assegurem seu cumprimento.
Um desses instrumentos é o Acordo de Sócios/Acionistas, que deve prever cláusulas específicas sobre voto, sucessão e, principalmente, sobre a compra e venda de quotas. Parte dessas regras essenciais será, adicionalmente, contemplada no Contrato Social ou no Estatuto Social.
A família também pode utilizar testamentos sempre que o empresário optar por reter para si uma parcela do patrimônio em vez de antecipar integralmente a sucessão.
Também é muito útil a divisão da família em ramos, definidos pela descendência de cada fundador. Cada ramo pode eleger um representante para os diversos órgãos de deliberação.
Essa estratégia garante que todos os “troncos” da família tenham voz nas decisões e previne que famílias maiores exerçam preponderância apenas pelo número de seus membros. Dentro de cada ramo, os herdeiros podem ainda organizar a distribuição interna de suas quotas ou ações.
A utilização coordenada desses instrumentos jurídicos é uma forma de assegurar uma gestão eficiente da empresa familiar, removendo os vetores de conflito e criando condições de atratividade indispensáveis ao sucesso de um M&A.