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Quando o WhatsApp domina, o vendedor perde espaço

Foto: divulgação
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Por Rafael Calixto, CEO da Zydon.

O uso do WhatsApp como principal canal de vendas se tornou regra no Brasil e, em muitos segmentos, o volume de pedidos feitos pelo aplicativo já supera o do próprio e-commerce, com taxas de conversão até seis vezes maiores, segundo o Chat Commerce Report 2025. De acordo com o levantamento, 95,21% das interações digitais entre marcas e consumidores ocorreram no aplicativo, confirmando sua posição de destaque como vitrine, meio de comunicação e canal de checkout.

Mas essa centralidade, apesar de gerar conveniência imediata, expõe uma fragilidade silenciosa, a de transformar vendedores altamente capacitados em simples tiradores de pedido. E isso ocorre justamente num momento em que as empresas precisam de previsibilidade, dados estratégicos e capacidade de gestão comercial, três pilares que o WhatsApp, por si só, não consegue sustentar. A normalização desse comportamento cria um entendimento distorcido de eficiência, em que acredita-se que mais pedidos via WhatsApp indicam maturidade comercial, no entanto, ocorre o contrário.

Quando o aplicativo se torna o sistema de vendas, e não apenas parte dele, a operação perde profundidade, pois o vendedor deixa de exercer seu papel estratégico — prospectar, negociar, diagnosticar necessidades e construir soluções — para atuar como operador manual de demandas. Essa mudança de função tem consequências diretas, como retrabalho, informações duplicadas, menor tempo dedicado à venda consultiva e perda de visão sobre pipeline e oportunidades.

Isso não é coincidência, com cerca de 3 bilhões de usuários mensais, segundo a Meta, o WhatsApp se consolidou como ferramenta de trabalho para pequenas e médias empresas. E seu uso está profundamente enraizado no comportamento do consumidor: 82% dos brasileiros já se comunicam com marcas pelo aplicativo e 60% afirmam já ter comprado por lá, de acordo com o relatório da Opinion Box. Isso explica por que 70% dos negócios o utilizam como parte das estratégias de marketing, vendas e relacionamento, segundo o Panorama de Marketing e Vendas 2024.

No entanto, a popularização não elimina, ao contrário, amplia o efeito colateral da dependência. Quando toda a operação comercial está concentrada no WhatsApp, a empresa fica vulnerável. Dados estratégicos ficam fragmentados nas conversas individuais dos vendedores. Quando um colaborador se desliga, os históricos, acordos, bases de clientes e informações valiosas simplesmente desaparecem. Além disso, a ausência de métricas claras, rastreabilidade e centralização impede análises consistentes e fragiliza a governança comercial. 

Essa realidade limita a capacidade de prever resultados, executar ações de CRM, modelar comportamento de compra e tomar decisões orientadas por dados, justamente os diferenciais mais necessários no ambiente competitivo atual. Reverter esse cenário exige reposicionar o WhatsApp dentro da jornada comercial. Ele não deve ser o sistema em si, mas o ponto de entrada. Ao transferir pedidos e interações para processos estruturados, portais B2B, catálogos digitais, carrinhos automatizados, integrações de ERP ou fluxos apoiados por inteligência artificial, a empresa recupera o domínio sobre informações, reduz erros e cria padrões operacionais mais escaláveis.

Diante disso, o vendedor deixa de ser um executor de tarefas repetitivas e volta a atuar como especialista comercial, com foco em relacionamento, diagnóstico e expansão da carteira. Quando os pedidos são centralizados e automatizados, sobra tempo para analisar indicadores, construir propostas mais estratégicas e gerar valor real para o cliente. Portanto, a solução não está em abandonar o WhatsApp, mas em recolocá-lo em seu devido papel: um canal de comunicação, não um sistema de venda.

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