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Um Natal de tela é um natal perdido

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Foto: cottonbro studio/Pexels
Foto: cottonbro studio/Pexels

Natal. Uma época que, por séculos, simbolizou comunhão, abraços apertados, brincadeiras em família, a espera pelo amigo secreto e a ansiedade para abrir presentes que pulsavam imaginação: carrinhos, bonecas, bicicletas, jogos de tabuleiro, livros, bolas. Presentes que convidavam ao encontro, ao movimento, ao faz de conta, ao riso compartilhado.

Hoje, um dos presentes mais esperados pelas crianças é uma tela: tablet, smartphone, console. Dispositivos que, em vez de abrir portas para o mundo real, trancam a infância em uma cela de pixels.

A normalização de dar telas como presente de Natal é um sintoma da nossa falência coletiva em proteger a infância. Estamos presenteando nossas crianças com sedentarismo, isolamento, distúrbios do sono, prejuízos na atenção e no aprendizado, e, não raro, uma porta de entrada para o consumo de conteúdo inadequado e precoce. Presentes que silenciam a voz da criança, reduzem sua criatividade à interação com uma tela e apagam a beleza do tédio criativo.

O Natal, antes sagrado no sentido mais humano do termo, tornou-se um desfile de distrações digitais. Pais com celulares em punho, crianças em silêncio diante de um aplicativo, parentes olhando para telas enquanto a ceia esfria e as memórias deixam de ser construídas.

Estudos clínicos são contundentes: tanto em adultos quanto em crianças, o uso excessivo de telas está ligado a transtornos de ansiedade, depressão, obesidade, miopia precoce, atraso na linguagem, compulsões e problemas de postura. Estamos, literalmente, comprando nossa própria ruína e embalando com papel laminado de Natal.

Lembre-se do Natal sem Wi-Fi. Da mesa cheia, do cheiro do peru assado, da briga para ver quem ia secar a louça, do primo que sempre roubava no jogo da velha. Lembra quando a maior disputa era quem ia ser o Papai Noel do ano? A ausência da tela era presença de afeto.

Reverenciar essas memórias não é nostalgia vazia. É resistência. É propor que, neste Natal, ao invés de um novo smartphone, você presenteie uma criança com tempo de qualidade, com uma bola, uma boneca de pano, um livro ilustrado, um quebra-cabeça, um forte apache, uma amarelinha desenhada no chão.

Que tal oferecer uma brincadeira em vez de um aplicativo? Uma memória em vez de uma notificação? Um chão de terra em vez de uma tela de vidro?

O verdadeiro espírito do Natal está nas relações. Está no olho no olho, na escuta generosa, na risada despretensiosa. Presentear com tela é um pacto com o silêncio digital.

Sejamos rebeldes. Devolvamos às crianças o que delas está sendo roubado: a infância.

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empreendedor, CEO da EquilibriON e especialista em bem-estar digital.

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