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Facilitação do comércio exterior para inglês ver?

Larry Carvalho
Foto: divulgação

Por Larry Carvalho, advogado, mestre em direito marítimo e especialista em logística, comércio internacional e agronegócio.

Para os que não conhecem a famosa expressão, ela surgiu quando a Inglaterra tentou abolir a escravidão no mundo. Para enganar a potência, o Império Brasileiro designou navios para caçar e combater navios negreiros. Entretanto, na prática, tudo não passava de uma encenação “para inglês ver”.

Passados os anos, esse espírito ainda permeia nossas relações internacionais. Principalmente nas recentes convenções de facilitação do Comércio Exterior promulgadas pelo Brasil.

Nos últimos anos, o Brasil vem adotado compromisso no exterior de facilitar o Comércio Exterior, inclusive o de não aplicar penalidades excessivas, especialmente quando cometidos de boa-fé, sem intenção fraudulenta nem negligência grosseira.

Na prática o mindset da aduana e as instruções normativas não mudaram. Empresas continuam a ser punidas indiscriminadamente, por qualquer erro, seja o mais simples possível, independente de terem gerado algum embaraço a fiscalização ou dano ao erário.

Os compromissos assumidos no exterior são meramente “para inglês ver”. Muitas vezes, mais preocupados em subir alguns graus em rankings de “doing business”, menos preocupados com o resultado prático e a redução de custos e burocracias para o empresário brasileiro.

O mais recente foi com a Pena de Perdimento. Após três anos de muitas brigas, o Brasil finalmente alterou sua legislação interna para fins de compatibilizar com os regramentos da Convenção de Quioto. Assegurando, finalmente, o direito de recurso (duplo grau de jurisdição) no Procedimento de Pena de Perdimento.

O mercado comemorou como um todo. Porém, a felicidade durou pouco, pois a lei delegou para o Ministério da Fazenda regulamentar o processo administrativo. E, prontamente, medidas foram adotadas para que o direito a recurso fosse apenas “para inglês ver”.

Através de portaria, foi criado o Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul), no âmbito da RFB e composta por Auditores fiscais. Assim, além de termos servidores da Receita Federal aplicando penalidade e julgando defesas, eles agora também serão responsáveis por apreciar os recursos.

Em sentido diametralmente oposto, o Brasil ao aderir à Convenção de Quioto, se comprometeu em permitir que o recurso da pena de perdimento fosse apreciado por uma autoridade independente da administração aduaneira.

Necessário lembrar de um parecer da Procuradoria da Fazenda de 2014 de que o CARF não integraria a estrutura da RFB, portanto, os seus representantes junto ao órgão seriam independentes e imparciais, pois não estariam subordinadas tecnicamente às diretrizes emanadas pela RFB.

Nas palavras da prof. Fernanda Kotzias, conselheira do CARF.

“Os argumentos da Procuradoria da Fazenda para demonstrar que os julgadores do Carf seriam independentes e imparciais, de forma a dar legitimidade ao processo administrativo […] podem ser, ipsis litteris, utilizados para contestar a validade da reforma atual e a imparcialidade e adequação do Cejul”.

E, no final do dia, o sentimento que prospera entre os players do setor é que foi tudo articulado “para inglês ver”. Dessa forma, continuamos a ser o “anão diplomático”, não coincidentemente é que somos um dos países mais fechados para o Comércio Exterior (proporcionalmente).

Mais do que “para inglês ver”, o setor necessita de reformas e mudanças que visam efetivamente coadunar nossa realidade com a prática global. Só assim, teremos chances de competir de igual para igual no mercado internacional.

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