Por Alcione Pereira, fundadora e CEO da Connecting Food.
O mundo vive um momento muito crítico no que diz respeito ao aquecimento global, o que acende ainda mais o alerta para que líderes de diversas nações voltem seus esforços para as questões socioambientais. Durante esta semana, em Nova Iorque, aconteceu mais uma edição da Climate Week – Semana do Clima, que reuniu milhares de pessoas, além de líderes de grandes empresas, representantes políticos e de diversos setores de todo o mundo, para discutir as necessidades locais e globais em torno da crise climática que vem se agravando cada vez mais, nas últimas décadas.
Em um dos fóruns da Semana do Clima, foram avaliadas as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (que são cerca de 600 no total) e a conclusão foi de que 80% das cidades mapeadas não conseguiram atingir nenhuma delas até agora. Por isso, está em pauta refazer e reconciliar essa agenda, para que ela esteja mais de acordo com a realidade atual, além de utilizar mais tecnologia, aplicar medidas de emergência, mudar processos e lideranças.
Em paralelo, foi realizada a reunião do grupo Champions 123, coalizão internacional de combate às perdas e desperdícios de alimentos, onde foi lançado a atualização anual do “Champions Progress Report“, relatório que trata dos mais recentes desenvolvimentos em relação ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 12.3, que visa reduzir os desperdícios em 50% até 2030. Isso porque a cadeia de alimentos e seus processos, desde a produção até o percurso desses alimentos para chegar à mesa das pessoas, também trazem impacto ambiental para o mundo, uma vez que para o plantio há perda de biodiversidade, degradação do solo, emissões de gases de efeito estufa, descarte de alimentos em aterros sanitários, além de todo o impacto social envolvido, que afeta milhares de pessoas em situação de insegurança alimentar ou fome.
As notícias trazidas pelo relatório não são das mais animadoras, já que, pelos resultados atingidos até agora, se tudo continuar sendo feito da mesma maneira, as metas deste ODS não serão cumpridas. No Brasil, a questão das doações de alimentos envolve fatores complexos para ser efetiva, e entre eles está a otimização dos requisitos regulatórios e fiscais. Por toda a estrutura fiscal envolvida, no país é mais caro fazer doações do que jogar o alimento fora.
Seguindo o relatório, observamos alguns caminhos que podem ser efetivos, como: a necessidade de educar a ponta da cadeia de alimentos – o consumidor final – que é enorme e urgente. Porém, o desperdício também está obviamente presente em toda a cadeia produtiva e precisa ser travado nos demais níveis, com a intervenção de todos os atores envolvidos. Além disso, o engajamento dos governos é fundamental como catalisador para as mudanças que são necessárias, com incentivos, investimentos e políticas públicas dedicadas à redução do desperdício.
A utilização da tecnologia e de outras ferramentas disponíveis também é imprescindível, para que as empresas do setor consigam mapear e mitigar as fontes das suas perdas. Ainda nesse sentido, é preciso educar e capacitar aqueles que trabalham no setor. A atuação na causa primordial das perdas e do desperdício – a transformação dos sistemas alimentares – é uma condição para que seja possível reduzir o grande impacto que o setor causa no meio ambiente.
Os dados mostram que o desperdício tem relação direta com a insegurança alimentar, especialmente nos níveis do produtor rural e do consumidor final, o que configura mais uma razão para se atacar o problema de frente. Por isso, precisamos caminhar para uma mudança de comportamento em diferentes setores da sociedade, assim, é possível reduzir o desperdício de alimentos e destiná-los para o seu propósito real: alimentar e nutrir pessoas. E, apesar das atualizações não tão positivas trazidas pelo relatório, o movimento tem se intensificado de todos os lados, o que traz um grande alento para nós que trabalhamos todos os dias nessa direção.