Falar sobre liderança é mais desafiador em alguns setores do que em outros. É o caso do mercado financeiro, especialmente se a empresa atua em área ainda em amadurecimento, a exemplo, os ativos judiciais, em que venho empreendendo nos últimos anos. Nessas condições, além de todo o domínio sobre as nuances do setor e as lições tradicionais de liderança, é fundamental saber adotar práticas que resultem em construção de credibilidade, segurança jurídica e performance sustentável.
Aspectos como habilidade de negociação e garantia de compliance em cada etapa do negócio são pré-requisitos e é indispensável que os empreendedores do setor desenvolvam estilos de liderança que gerem impactos positivos nestes pilares, fazendo com que eles se mostrem presentes na forma de agir do time como um todo.
Negociar é construir confiança antes de tudo
Quando falamos de negociação, pensamos rapidamente em habilidades técnicas: saber precificar, entender o perfil do investidor, ter domínio sobre o produto. Mas o que realmente define uma negociação bem-sucedida, especialmente em mercados com alta regulação, é a capacidade de construir confiança entre todos os envolvidos.
Essa confiança nasce da transparência e da previsibilidade — que são pilares do compliance — e se consolida no exemplo que vem da liderança – não apenas do líder formal, mas de qualquer pessoa que ocupa um espaço de influência dentro da estrutura.
Negociar, no nosso caso, é mais do que fechar acordos vantajosos. É garantir que esses contratos sejam sustentáveis, juridicamente sólidos, bem documentados, auditáveis. É criar um ecossistema em que todos — investidores, times internos, parceiros e beneficiários finais — saibam que o que foi acordado será cumprido, com integridade e consistência.
A liderança como espinha dorsal do compliance
Compliance é, muitas vezes, associado apenas a estruturas jurídicas e regulatórias. Para muita gente é apenas um reflexo de políticas e questões burocráticas. Vai muito além: começa em uma cultura que valoriza o certo, mesmo quando isso representa o caminho mais difícil. É o tipo de coisa que não acontece sem liderança, sem pessoas que encarnem esse espírito e lembrem todo o time de que não há opção fora dele.
Vivi na Droom o processo de implantação de uma governança formal e não me canso de dizer o quanto isso foi um divisor de águas para o negócio. Hoje temos um conselho deliberativo (com espaço formal para discutir os aspectos mais estratégicos para nosso crescimento), padronizamos fluxos e desenhamos rituais de decisão. Tudo isso reduziu a dependência das decisões centralizadas e aumentou a robustez dos nossos processos.
Mas, para que pudesse acontecer, foi necessário um exercício de desapego. Como empreendedora, estar na operação é algo que sempre me deu prazer, então precisei aprender que continuar sendo protagonista de tudo, mesmo que por zelo e paixão, era um risco – para mim, que poderia me dedicar a outras missões mais estratégias, para o time, que teria sua autonomia tolhida, e para o negócio, que perderia oportunidades de crescimento.
Foi nesse processo que vi na prática aquilo ensinado em tantos livros de gestão: liderar é preparar o caminho para que você não seja insubstituível. É criar processos que não precisem de você para funcionar. É formar pessoas com autonomia para decidir. E é aceitar que compliance forte começa quando o ego da liderança é colocado em segundo plano.
A maturidade emocional por trás da liderança de impacto
Em mercados como o nosso, onde o conhecimento técnico é profundo e a margem de erro é pequena, a figura do líder costuma ser idealizada como alguém infalível, distante, impositivo. Eu mesma precisei, por muito tempo, vestir essa armadura.
Mas a maturidade emocional que a governança exige é justamente a de saber abrir espaço. Saber ouvir. Saber que seu papel não é mais “resolver tudo”, mas “permitir que tudo seja resolvido”. Essa virada de chave, pessoal e profissionalmente, é o maior presente que o compliance me deu.
Hoje, vejo com clareza que o estilo de liderança que queremos promover não é o de heróis solitários, mas de mobilizadores consistentes. Pessoas que inspiram pelo exemplo, que compartilham vulnerabilidades com responsabilidade e que constroem ambientes em que o erro vira aprendizado — e não ruído.
Liderar é provocar permanência
Liderar negociações complexas, garantir compliance e construir uma governança sólida é uma combinação que demanda técnica, sim — mas exige ainda mais visão de longo prazo, sensibilidade e coragem de mudança.
Para quem atua em empresas familiares ou em estruturas em crescimento acelerado, como é o nosso caso, a presença ativa da liderança nessas pautas deixa de ser diferencial e passa a ser essencial.
Liderar é provocar permanência. É preparar o terreno para que o negócio continue forte, mesmo quando a liderança muda. É garantir que o que foi acordado, negociado, construído… permaneça.
E isso só é possível quando se compreende que o papel da liderança não é estar em todas as frentes, mas garantir que todas as frentes estejam alinhadas com os valores, com os processos e com o propósito da empresa.