Por Andrea Rios, fundadora da Orcas.
As datas comemorativas são as melhores para o varejo, mas o setor de beleza tem chamado cada vez mais atenção. A forma de compra desses produtos nem sempre é a tradicional ida ao shopping para testar e escolher produtos. Hoje é mais comum comprar o presente por meio de apps, e-commerces, redes sociais e marketplaces. A prova disso é que o segmento está se tornando cada vez mais omnichannel, embora ainda haja muito espaço para crescer. No Brasil, o setor de beleza avança em direção à integração de canais, mas ainda há um longo caminho para traduzir tecnologia e dados em fidelização e crescimento sustentável.
O ecossistema de marcas de beleza pode ser dividido, de forma geral, em três perfis: varejistas-fabricantes com canais próprios, grandes marcas fabricantes globais com dependência de terceiros e nativas digitais. Cada grupo lida de forma diferente com a omnicanalidade e apresenta níveis distintos de maturidade, principalmente em relação ao uso de inteligência artificial (IA).
Entre as marcas mais avançadas está o Boticário. Com canais próprios de venda, incluindo lojas, e-commerce e apps, controla a cadeia de valor end-to-end, permitindo a captura e utilização de dados para personalização da jornada. Tem forte presença em mobile e integração com mídias sociais, além de maior consistência entre canais digitais e pontos de venda físicos. Por outro lado, ainda existem oportunidades para aprimorar a personalização do atendimento omnichannel, com cruzamento de dados da loja, site e app, para recomendações em tempo real no ponto de venda físico, criação de ofertas exclusivas mobile-to-store, ou seja, a geração de ofertas via app que só podem ser resgatadas em loja física, o que promove aumento do tráfego no ponto de venda.
A Natura segue caminho semelhante, com forte apelo de marca, presença digital robusta e campanhas com propósito. No entanto, apresenta lacunas no mobile e seu desempenho em mídias sociais e marketing integrado é sólido, mas pode evoluir. A venda direta é um destaque da marca e pode ser integrada ao omnichannel, ao permitir que as consultoras usem dispositivos para realizar vendas assistidas com integração direta ao estoque online e físico. Elas também podem ser treinadas para serem “omnichannel advisors”, atendendo clientes por WhatsApp, app, redes sociais e loja física, com acesso a dados e promoções personalizadas.
Marcas fabricantes globais, como Dove e Elseve, enfrentam desafios diferentes. Isso porque elas possuem grande penetração no mercado, mas a venda é dependente de terceiros, como supermercados e farmácias, o que gera baixa personalização, com pouco controle da jornada do consumidor. A experiência digital é genérica, faltam apps e e-commerce próprios para contato direto com o consumidor. A maior característica destas marcas é a alta capilaridade, o que mostra que os varejistas parceiros têm boa infraestrutura logística.
As principais oportunidades para essas empresas estão na criação de experiências digitais próprias, seja por meio do app, conteúdo personalizado e campanhas interativas para estreitar o relacionamento, além da integração da jornada online, com foco em conteúdo educativo, testes virtuais de produto e parcerias digitais com influenciadores. A integração de dados com varejistas parceiros é importante para ampliar a visibilidade da jornada e gerar estratégias omnichannel baseadas em comportamento real do consumidor.
Mas nem só de gigantes vive o mercado de beleza. Crescem as marcas digitais independentes, que possuem uma proposta inovadora. A Braé é uma delas, que se destaca pelo social commerce e pela comunidade ativa, branding moderno e estética refinada. Realiza as vendas por meio de e-commerce próprio e ativa seu público por meio da forte presença nas redes sociais e influenciadores.
Por outro lado, a marca perde ao não oferecer uma experiência omnichannel completa. A ausência de canal físico estruturado gera pouco controle sobre experiências em salões, lojas ou quiosques e o atendimento é pouco desenvolvido, com ausência de call center ou canais de atendimento integrados. Há a necessidade de criação de uma experiência omnichannel de ponta a ponta, de oferecer “clique e retire” em salões parceiros, integração com marketplaces e devolução facilitada. A marca também deve investir em atendimento omnichannel humano e automatizado, incluindo WhatsApp com IA e chat em tempo real. É preciso integrar o app com jornada personalizada, incluindo quiz de diagnóstico capilar, histórico de pedidos, sugestões baseadas em uso, além de ampliar o uso de dados do cliente, com campanhas personalizadas com base em preferências.
Com todo este cenário, ainda há mais um ponto a ser melhor explorado de maneira geral pelo mercado: a IA. Embora essa tecnologia já seja aplicada, ainda há muito espaço para utilizá-la de forma a estimular o consumidor, gerando aumento de recompra, lealdade e crescimento de volume no longo prazo. Vale lembrar que este é o principal objetivo da experiência omnicanal: estimular a lealdade e o crescimento em volume.
Há uma lacuna entre as possibilidades da IA e a aplicação estratégica dos dados para transformar a experiência do consumidor. A personalização profunda, o ajuste de sortimento por região, a criação de jornadas customizadas por perfil e o uso de insights de consumo ainda são subutilizados. O desafio está em sair da experimentação pontual e migrar para um uso sistêmico e contínuo da inteligência artificial como aceleradora da experiência omnicanal. São diversas aplicações da IA que podem acelerar a experiência omnicanal do cliente e que ainda precisam ser melhor exploradas. O mercado da beleza tem muito a crescer em omnicanalidade no país.