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Reputação em risco: o que a crise da Cacau Show revela sobre liderança e cultura empresarial

Foto: divulgação

Por Daniela Coelho, diretora de gestão de riscos e continuidade de negócios da Protiviti.

Nas últimas semanas, a Cacau Show, uma das marcas mais reconhecidas do varejo brasileiro, se viu mergulhada em uma crise de imagem que, se não for administrada com precisão e responsabilidade, pode se transformar em um abalo profundo na reputação construída ao longo de mais de 30 anos de história. A origem dessa crise? Denúncias de franqueados/stakeholders que, até então, eram considerados parceiros estratégicos e pilares do crescimento da empresa.

Essas denúncias, inicialmente restritas ao ecossistema de franquias, ganharam escala nas redes sociais e nos canais de mídia. Em pouco tempo, relatos de funcionários atuais e ex-colaboradores passaram a surgir, acrescentando camadas preocupantes à narrativa. Embora nem todas as informações possam ser verificadas de imediato, o volume e a semelhança entre os relatos chamam a atenção e colocam em xeque a cultura organizacional da empresa.

A situação evidencia algo que muitas companhias ainda subestimam, uma crise de imagem pode rapidamente se tornar uma crise de reputação e são conceitos distintos. Imagem é a percepção momentânea que o público tem da marca, já a reputação é construída ao longo do tempo, baseada em ações consistentes, valores e histórico. Quando a primeira ameaça a segunda, o impacto é muito mais profundo e difícil de reverter.

Além do dano simbólico, há consequências concretas. Em um cenário onde os ativos intangíveis, como marca e reputação, representam parcela significativa do valor de mercado de uma empresa, perder a confiança de franqueados, funcionários e consumidores pode comprometer projetos futuros, resultados financeiros e até a sustentabilidade do negócio.

Nesse contexto, o papel da liderança é determinante. A carta enviada pelo CEO aos franqueados foi um passo importante, mas talvez insuficiente para conter o avanço da crise. Em tempos de alta exposição nas redes sociais, as respostas precisam ser rápidas, transparentes e acompanhadas de ações concretas de reparação e escuta ativa. A comunicação institucional não pode ser apenas defensiva, ela precisa ser empática e, principalmente, responsável.

É necessário reconhecer, no entanto, que parte do discurso da empresa traz elementos válidos. O setor de chocolate enfrenta desafios globais reais. O aumento no preço do cacau, impulsionado por eventos climáticos extremos nos principais países produtores, têm pressionado a cadeia de produção. Em um podcast recente, discutimos justamente como os riscos climáticos estão afetando o agronegócio, e o caso do cacau é um exemplo claro. Essa conjuntura econômica, embora legítima, não deve ser usada como cortina de fumaça para abafar denúncias sérias sobre más práticas internas.

A crise da Cacau Show é, portanto, multifacetada. Não se trata apenas de uma disputa pontual com franqueados ou de uma reclamação isolada de colaboradores. É um sinal de alerta sobre a importância de manter coerência entre discurso e prática, principalmente em empresas que cresceram apoiadas na promessa de acolhimento, qualidade e propósito.

Agora é acompanhar o desenrolar desse enredo. Resta saber se a marca será capaz de atravessar essa turbulência para ouvir, corrigir e evoluir. O consumidor está cada vez mais atento e a confiança, uma vez quebrada, não se recompõe com marketing, mas com atitudes. Vamos observar!

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