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Herança disruptiva: o futuro da tradição nasce da inovação

Foto: Daniel Santos.

Por Guilherme Skaf, head da Rosey Ventures, CVC do Grupo Marista.

Toda empresa tradicional carrega uma história. São anos, às vezes décadas ou séculos, construindo processos, marcas, produtos e, principalmente, confiança. Mas o tempo, que consolida a reputação, também impõe um risco: o de tornar a estrutura rígida demais para acompanhar as mudanças.

É nesse ponto que a inovação entra. E mais do que tecnologias, inovar é permitir que novas ideias se misturem à cultura já existente, transformando-a sem descaracterizá-la.

Na outra ponta, startups, por sua natureza, vivem do inusitado. Elas experimentam, erram rápido, ajustam e recomeçam. Essa agilidade é tudo o que grandes empresas muitas vezes perderam ao longo dos anos, não por falta de capacidade, mas por excesso de estrutura.

Quando esses dois mundos se encontram, nasce uma tensão criativa poderosa: de um lado, a força do legado, do outro, a leveza do novo. A chave está em enxergar esse encontro não como uma ameaça, mas como uma chance real de evolução mútua.

O maior desafio para quem já trilhou um longo caminho, é abrir espaço para o improviso, para o teste, para o risco. E isso exige desapego. É natural que empresas consolidadas tenham receio de ceder controle, afinal, tudo nelas foi desenhado para reduzir incertezas.

Mas inovar é, essencialmente, aceitar o desconforto como parte do processo. Ao conviver com startups, corporações são desafiadas a revisitar seus próprios modelos mentais e operacionais. E essa fricção, quando bem conduzida, pode ser profundamente transformadora.

Mais do que aplicar soluções prontas, a convivência com startups ensina uma nova forma de pensar problemas. É menos sobre eficiência e mais sobre possibilidade.

À medida que empresas tradicionais se abrem para esses aprendizados, percebem que inovação não precisa vir à custa da identidade, pelo contrário, ela pode ser o caminho para ressignificá-la. O futuro da tradição não está em negar o passado, mas em permitir que ele dialogue com as novas urgências do presente.

Nesse contexto, estruturas como o Corporate Venture Capital surgem como uma ponte possível, e cada vez mais necessária, entre dois mundos que têm muito a aprender um com o outro. Ao investir em startups com propósito e estratégia, empresas consolidadas conseguem experimentar o novo sem abandonar o que as trouxe até aqui.

O CVC bem estruturado atua como um tradutor entre linguagens distintas, ampliando as possibilidades de transformação com inteligência, respeito à cultura e foco em valor de longo prazo.

Para que essa integração aconteça de fato, é preciso envolver as pessoas certas: lideranças dispostas a ouvir, áreas de negócio abertas à experimentação e embaixadores internos capazes de fazer conexões.

A inovação não se consolida por decretos, ela se constrói com exemplos, casos reais e pequenas vitórias que mostram que é possível fazer diferente sem perder a essência. É quando os aprendizados deixam de ficar confinados às “caixinhas de inovação” e passam a influenciar o core do negócio que o impacto se multiplica.

Assim, tradição e inovação não são opostas, são forças complementares. Quando uma empresa tradicional escolhe se abrir ao novo sem renunciar à sua identidade, ela amplia seu legado, o qual não se resume ao que foi construído, mas se projeta para o que ainda está por vir.

O futuro, afinal, não nasce do rompimento com o passado, mas da coragem de transformá-lo. Dessa forma, quando o passado inspira o futuro, e o futuro respeita o passado, surge uma herança disruptiva, viva, em movimento e pronta para atravessar gerações.

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