Por João Antonio de Albuquerque e Souza, presidente do Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem (TJD-AD)
Os e-sports deixaram de ser uma tendência de nicho para se tornar uma indústria global consolidada. Jogos como Fortnite, Counter-Strike, Grand Theft Auto V, FIFA, League of Legends e Minecraft já não são apenas produtos de entretenimento, e sim plataformas competitivas e de consumo de conteúdo, que atraem milhões de jogadores e espectadores diariamente. No Brasil, segundo dados da Newzoo, existem mais de 100 milhões de jogadores, dos quais 55% assistem conteúdos de jogo, 27% acompanham competições de e-sports e 12% se consideram entusiastas, evidenciando o tamanho e o engajamento desse público.
O crescimento desse mercado impacta diretamente a forma como desenvolvedoras projetam seus jogos. Hoje, é necessário pensar não apenas na jogabilidade, mas também na experiência do espectador. Competir de forma atrativa para o público se tornou tão importante quanto criar um produto divertido para jogar. Essa mudança reflete a profissionalização do setor, que passou a investir em transmissões, comentários especializados, eventos presenciais e premiações que aproximam fãs e atletas virtuais.
A dimensão e o engajamento dos e-sports têm levado até o Comitê Olímpico Internacional (COI) a considerar formas de inserir modalidades de jogos eletrônicos nos Jogos Olímpicos ou mesmo criar um evento olímpico próprio para e-sports. Essa discussão ganha relevância diante do envelhecimento do público de esportes tradicionais e da necessidade de atrair novas gerações, que já estão imersas em realidades digitais, jogando, assistindo competições e seguindo influenciadores especializados nas redes sociais.
O interesse em e-sports não é apenas cultural, mas também econômico, em que a audiência crescente gera oportunidades de patrocínios, publicidade e monetização direta em transmissões. Além disso, o setor movimenta apostas esportivas significativas, criando a necessidade de regulamentação e monitoramento, similar ao que ocorre em modalidades tradicionais. A profissionalização dessas práticas é fundamental para garantir transparência e justiça nas competições.
No entanto, um dos desafios mais urgentes é a questão da integridade esportiva, já que atualmente, os testes de doping em e-sports são quase inexistentes, enquanto o uso de estimulantes e substâncias que aumentam desempenho cresce entre competidores. A supervisão adequada e a aplicação de regras rigorosas, possivelmente sob a tutela do COI ou de entidades especializadas, são passos essenciais para proteger atletas, investidores e espectadores.
Além disso, a regulamentação pode contribuir para mitigar fraudes e manipulação de resultados em apostas esportivas, um ponto crucial em um mercado de e-sports que já movimenta cifras expressivas. A ausência de fiscalização e padronização gera riscos significativos tanto para o setor quanto para a confiança do público, tornando essencial garantir integridade e credibilidade para consolidar a indústria em nível global.
A profissionalização e o reconhecimento oficial dos e-sports também podem gerar impactos sociais positivos, criando carreiras estruturadas, oferecendo oportunidades de educação e desenvolvimento de habilidades digitais, e estimulando práticas éticas de competição. Dessa forma, o setor passa a oferecer alternativas concretas de crescimento profissional para jovens em um ambiente cada vez mais digitalizado.
Portanto, os e-sports representam uma mudança de paradigma no consumo de esportes e entretenimento, e a combinação de audiência engajada, potencial econômico e oportunidades de inovação exige atenção das instituições esportivas, empresas e investidores. Com regulamentação adequada e acompanhamento estratégico, esses esportes digitais têm potencial para se tornar parte integrante da cultura esportiva mundial, criando novas formas de competir, assistir e investir.