Por Diego Nogare, mestre e doutorando em IA.
Nos últimos meses, uma nova expressão começou a circular entre profissionais de tecnologia e inovação: Vibe Coding.
O termo, eleito a palavra do ano de 2025 pelo Dicionário Collins, descreve um jeito diferente de programar: mais intuitivo, rápido e acessível, impulsionado pela inteligência artificial.
Na prática, o Vibe Coding representa a democratização do código. Agora, qualquer pessoa pode criar software apenas dizendo em linguagem natural o que deseja construir, sem precisar dominar linguagens de programação ou estruturas complexas.
Essa autonomia abre espaço para que especialistas de negócio, analistas de marketing ou consultores financeiros transformem ideias em ferramentas digitais em questão de minutos.
Mas junto com essa liberdade criativa, surge uma nova preocupação: como garantir que tudo o que é gerado por IA seja seguro, auditável e siga as políticas corporativas? É nesse ponto que o entusiasmo com a inovação encontra o desafio da governança digital.
Baseada em Grandes Modelos de Linguagem (LLMs), essa tecnologia permite que qualquer profissional desenvolva aplicações funcionais simplesmente descrevendo, em linguagem natural, o que deseja criar.
Pela primeira vez, a capacidade de transformar ideias em código deixa de ser exclusiva de quem domina linguagens de programação, estruturas de dados ou algoritmos complexos.
No entanto, o mesmo fenômeno que acelera processos e reduz barreiras técnicas também amplia a superfície de ataque das organizações e desafia os métodos convencionais de segurança e governança.
O resultado é o surgimento de um ecossistema paralelo de software, criado “na vibe”, com boas intenções e resultados imediatos, mas frequentemente sem práticas essenciais de autenticação, criptografia, privacidade e revisão de código.
O relatório The Anthropic Economic Index Report, divulgado em setembro de 2025, analisou milhões de interações com o modelo Claude Sonnet e identificou uma mudança marcante no comportamento dos usuários.
As tarefas de criação de código mais do que dobraram, saltando de 4,1% para 8,6%, enquanto as de depuração e correção de erros caíram de 16,1% para 13,3% no período analisado.
Em outras palavras, os usuários estão gastando menos tempo corrigindo e mais tempo criando. Isso mostra que é possível experimentar mais rápido e barato, utilizando a IA como ferramenta para acelerar essa necessidade.
Esse deslocamento de “corrigir para criar” ilustra o motor do Vibe Coding, a transição de um papel técnico para um papel criativo, no qual o usuário não precisa compreender profundamente a lógica do código, apenas a intenção do que deseja construir.
Quanto mais autônomo o processo, maior a necessidade de estruturas de segurança e governança cada vez mais robustas e ágeis para acompanhar essa dinâmica.
Estamos diante de uma nova forma de Shadow IT, agora potencializada pela inteligência artificial: o Shadow AI Development.
Aplicações internas surgem em ritmo vertiginoso para resolver pequenos problemas de negócio, mas muitas vezes operam fora dos padrões corporativos de segurança, sem rastreabilidade ou governança sobre os dados que manipulam.
Essa descentralização cria um paradoxo: ao mesmo tempo que amplia a inovação, também multiplica os riscos e pressiona as empresas a repensarem seus frameworks de controle.
A intuição que impulsiona o Vibe Coding é poderosa na criação de valor, mas estruturalmente cega às complexidades não intuitivas da segurança digital.
A IA pode gerar código funcional e plausível, mas não necessariamente seguro. Em muitos casos, a funcionalidade “aparente” mascara vulnerabilidades, como armazenamento incorreto de senhas, uso de bibliotecas desatualizadas ou ausência de proteção contra ataques de injeção de código.
O problema não é a ferramenta, e sim o uso despreparado que confunde funcionar com estar protegido.
Essa transformação obriga as organizações a repensarem como equilibrar liberdade e controle, autonomia e responsabilidade, velocidade e segurança. A questão central deixa de ser “quem pode programar” e passa a ser “como garantir que o que foi programado é seguro, auditável e aderente às políticas corporativas”.
Nesse contexto, o papel do desenvolvedor também muda. Saber escrever código de memória perde relevância diante da necessidade de validar, auditar e proteger o que a IA produz.
As competências agora incluem arquitetura segura, engenharia de prompt consciente e a aplicação rigorosa de princípios de governança em um ambiente de criação distribuída. O profissional de tecnologia passa de executor para curador e guardião da integridade digital.
Para as empresas, o aprendizado é que a velocidade só é uma vantagem quando acompanhada de governança. A agilidade prometida pela IA precisa ser sustentada por bases sólidas, como confiança digital, padrões de desenvolvimento seguro e políticas claras de uso responsável da tecnologia.
Isso exige novas práticas de capacitação, como treinar equipes não técnicas em fundamentos de segurança, adotar frameworks secure-by-design, integrar ferramentas de análise estática (SAST) e criar diretrizes de prompt engineering que incluam critérios explícitos de proteção de dados.
A governança, portanto, não é o oposto da inovação, mas o que a torna possível em larga escala. Organizações que souberem equilibrar essa liberdade criativa com controle inteligente terão uma vantagem competitiva duradoura. Conseguirão inovar com velocidade, mas também com resiliência, conformidade e credibilidade.
O Vibe Coding é, sem dúvida, uma das expressões mais poderosas da colaboração entre humanos e máquinas.
Mas para que essa revolução se consolide, e não se transforme em um problema de segurança em massa, precisamos tratá-la com a mesma seriedade que qualquer transformação tecnológica profunda exige: com visão, governança e responsabilidade.
A intuição pode guiar o código. Mas é a segurança que garante o futuro.