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Quando a realidade incendeia o discurso: lições da COP30 para o Brasil

Foto: divulgação
Foto: divulgação

Por Pedro de Medeiros, filósofo formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, engenheiro mecânico pela PUC e pós-graduado em Gestão de Pessoas, consultor de multinacionais, palestrante e escritor. 

A imagem em que a COP30 terminou, um incêndio consumindo parte da estrutura recém-montada, parece saída de um editorial satírico. Mas não é. O maior evento climático do mundo, projetado para discutir o futuro da humanidade, acabou cercado pelo símbolo mais cru do nosso presente: improviso, falhas básicas e vulnerabilidades estruturais que insistimos em ignorar.

Dias antes, o alerta já havia sido dado. Problemas no sistema de ar condicionado, que oscilava entre fraco e inoperante, expuseram uma fragilidade conhecida por quem vive e trabalha na região amazônica: nada resiste ao calor sem planejamento real. E, ainda assim, uma tecnologia elementar, consolidada há décadas, se tornou um obstáculo.

Esses episódios vão muito além do constrangimento. Eles funcionam como aquilo que os estudos de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) chamam de “momentos reveladores”: quando até tecnologias simples falham, fica transparente o quanto nossa infraestrutura ainda é incapaz de sustentar o futuro que prometemos ao mundo.

Porque a verdade é incômoda: o Brasil saiu da COP30 reafirmando que quer ser líder em energias limpas, e tem potencial para isso, mas mostrou, sem querer, o tamanho da distância entre discurso e capacidade estruturada. Energia solar, eólica, hidrogênio verde e biocombustíveis não são ideias futuristas. São sistemas complexos que dependem de logística confiável, engenharia de alta precisão, redes elétricas robustas, fiscalização séria e instituições estáveis. Queremos liderar o amanhã, mas tropeçamos no hoje.

A conferência deixou isso claro com uma sinceridade involuntária: falamos em transição energética, mas lutamos para climatizar auditórios. Ambicionamos inovação tecnológica, mas não garantimos o básico da operação. Aspiramos pelo protagonismo climático, mas convivemos com instalações vulneráveis a falhas elementares.

A pergunta que fica é inevitável: como liderar a inovação global quando ainda precisamos aprender a lidar com o essencial?

Essa não é uma crítica contra o Brasil, é um chamado para o que realmente importa. Ciência não é luxo, tecnologia não é acessório, engenharia não é detalhe. São os pilares mínimos para que qualquer promessa de futuro se torne realidade.

A COP30 não expôs apenas fragilidades logísticas, expôs uma urgência moral, econômica e institucional que evitamos encarar.
Se quisermos ser protagonistas no combate à crise climática, o caminho começa menos no discurso e mais no solo onde pisamos.

O futuro não falhou em Belém. Quem falhou foi o presente, e ele está pedindo para ser reconstruído com honestidade, competência e investimento real. Só então nossos pavilhões, físicos e institucionais, deixarão de pegar fogo.

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