Por Rodrigo Gava, CTO e co-CEO da VULTUS.
O lançamento do plano de ação da Aliança Nacional de Combate a Fraudes Bancárias Digitais marca um ponto de inflexão importante na forma como o Brasil passa a enfrentar os golpes financeiros contra pessoas físicas.
Não estamos mais diante de um problema isolado de bancos, aplicativos ou usuários desatentos. Trata-se de um ecossistema inteiro vulnerável, que exige respostas coordenadas, rápidas e baseadas em inteligência.
Colocar a vítima no centro da estratégia é, talvez, o maior acerto da iniciativa. Quem já sofreu um golpe sabe que o prejuízo financeiro vem acompanhado de uma sensação imediata de desamparo.
Muitas vezes, a maior angústia não é apenas o dinheiro perdido, mas não saber por onde começar, a quem recorrer, ou quais passos tomar. Nesse sentido, o lançamento do portal “Sofri um golpe e agora?” é um avanço concreto.
Ter um canal oficial com orientações claras, materiais educativos e informações consolidadas representa uma virada na forma como o Estado acolhe quem foi atingido.
Outro mérito relevante está na composição da Aliança. A presença conjunta de Ministério da Justiça, Banco Central, Receita Federal, Coaf, Anatel, Polícia Federal, Febraban, entre outros, revela um entendimento fundamental: fraudes digitais não nascem nem se encerram em um único ponto.
Um golpe pode começar em um anúncio falso numa rede social, migrar para um aplicativo de mensagens, utilizar dados vazados e terminar numa conta bancária. É um circuito digital integrado e só pode ser combatido como tal.
O verdadeiro potencial da Aliança, no entanto, está na capacidade de transformar dados dispersos em inteligência compartilhada.
Hoje, informações valiosas sobre golpes permanecem fragmentadas entre boletins de ocorrência, registros bancários, operadoras e plataformas digitais.
Quanto mais rápido esses dados forem cruzados, analisados e transformados em padrão de ação, maior a chance de interromper cadeias de fraude antes que se multipliquem.
Apesar dos avanços, alguns pontos merecem atenção para que a iniciativa produza impacto real na vida das pessoas.
O primeiro é a clareza da jornada da vítima: quem atende primeiro, quais são os passos seguintes e quais os prazos de resposta.
O segundo é o compromisso efetivo de compartilhamento de informações entre bancos, telecoms e plataformas, sempre respeitando a legislação, mas priorizando a proteção do cidadão.
E o terceiro é a existência de metas e indicadores públicos, que permitam à sociedade acompanhar a evolução na redução de golpes, no aumento de reversões e na efetividade da prevenção.
O plano tem horizonte de 60 meses, o que faz sentido para estruturar políticas permanentes. Mas o crime digital se adapta em ciclos muito mais curtos.
Em seis a doze meses, a população precisa sentir que algo mudou: que é mais fácil reportar um golpe, que as respostas são mais rápidas, que existem campanhas educativas em linguagem acessível. Isso é decisivo, inclusive, para a reconstrução da confiança no sistema financeiro.
A Aliança sinaliza uma mudança de patamar no enfrentamento às fraudes contra pessoas físicas. Agora, o desafio não é mais desenhar estruturas, é fazer com que essa arquitetura institucional vire rotina, cooperação e inteligência aplicadas no dia a dia.
Para que cada vítima deixe de ser apenas mais um número na estatística e passe a ser o ponto de partida para impedir que outras pessoas caiam no mesmo golpe.