Pesquisar

O custo invisível de tolerar comportamentos tóxicos de profissionais “brilhantes”

Imagem gerada por IA.
Imagem gerada por IA.

Quantas empresas perdem energia, talentos e resultado não por falta de competência técnica, mas por comportamentos que ninguém teve coragem de enfrentar?

Esse é um dilema silencioso e recorrente no mundo corporativo. Profissionais altamente qualificados, entregam resultados, dominam processos, conhecem o negócio. Ao mesmo tempo, criam tensão no ambiente, fragilizam relações, geram medo, desengajamento ou conflitos velados. E a liderança, diante do desempenho técnico, hesita. Tolera. Adia. Espera que “mais um feedback” resolva.

O problema é que o cérebro humano não funciona por compartimentos isolados. Ambientes emocionalmente inseguros ativam constantemente o sistema de ameaça, reduzindo colaboração, criatividade e capacidade de decisão. Não é discurso motivacional. É neurociência aplicada à gestão.

Segundo estudos da Gallup, equipes que operam em ambientes de baixa segurança psicológica apresentam maior rotatividade, mais afastamentos e queda consistente de produtividade. No Brasil, os afastamentos por transtornos mentais já figuram entre as principais causas de perda de dias trabalhados, com impacto direto no custo operacional das empresas.

Ainda assim, muitas organizações seguem tratando o problema como uma questão individual, e não sistêmica.

Na prática, o que observo em projetos de cultura e liderança é um padrão claro: empresas não mantêm comportamentos tóxicos por falta de informação, mas por medo do curto prazo. O receio de perder um talento técnico faz com que se aceite, silenciosamente, um custo invisível que se espalha pelo time. Pessoas boas pedem demissão. Outras adoecem. O clima se deteriora. O resultado começa a oscilar.

O paradoxo é evidente. O profissional considerado “indispensável” passa a ser o principal fator de instabilidade do sistema.

Aqui é preciso fazer uma distinção que líderes maduros aprendem a sustentar. Não se trata de punir pessoas difíceis, tampouco de improvisar soluções emocionais. Trata-se de parar de proteger comportamentos que adoecem a organização.

Cultura não é discurso, nem valor pendurado na parede. Cultura é o conjunto de permissões explícitas e implícitas que uma empresa sustenta todos os dias. Quando um comportamento desrespeitoso, agressivo ou desagregador não gera consequência, ele deixa de ser um desvio e passa a ser norma.

E normas moldam resultados.

Criar condições reais de mudança passa por clareza, não por tolerância excessiva. Expectativas comportamentais objetivas, critérios claros de convivência, responsabilização adulta e segurança psicológica caminham juntas. Empresas que fazem esse movimento deixam de personalizar o problema e passam a tratá-lo como parte da governança da cultura.

Não é coincidência que organizações mais maduras já tenham incorporado a gestão de riscos psicossociais à estratégia. A nova NR-1 apenas formaliza algo que o mercado global já entendeu: saúde emocional, comportamento e resultado não são temas separados. São variáveis interdependentes.

O futuro da competitividade não está apenas em inovação tecnológica ou eficiência operacional. Está na capacidade de construir ambientes onde pessoas entregam alto desempenho sem operar em estado permanente de ameaça.

A pergunta que fica para líderes e empresas é direta: vale mesmo a pena sustentar um talento técnico se o custo invisível compromete o sistema inteiro?

Empresas que querem crescer de forma sustentável precisarão decidir se continuam premiando apenas o que é entregue ou se estão prontas para assumir, de fato, a responsabilidade pelos comportamentos que escolhem tolerar.

Compartilhe

Consultora empresarial e palestrante, atua na transformação cultural de empresas por meio de programas de felicidade corporativa, segurança psicológica e sustentabilidade humana.

Leia também