Por Deives Rezende Filho, fundador da Condurú Consultoria, e Jenifer Zveiter, especialista em diversidade e inclusão na Condurú Consultoria, psicóloga clínica, educadora e orientadora profissional.
Vamos imaginar o seguinte cenário: estamos no ambiente de uma empresa que vem desenvolvendo políticas de Diversidade & Inclusão, divulgando vagas afirmativas e se abrindo para a contratação de pessoas negras, PCDs e LGBTQIAP+. Uma das pessoas recém contratadas , pertence a um desses grupos “minorizados” ou marginalizados, se aproxima de uma rodinha de conversa. Nesse momento, como num passe de mágica, o papo termina e a rodinha simplesmente se dispersa…
Eis aí uma situação típica de uma empresa que, apesar de investir em diversidade, não é de fato inclusiva. Não cria um ambiente em que todo o seu time, sem exceção, é acolhido. O que prova que nem sempre a ampla diversidade significa inclusão e reverte em retenção de pessoas e na melhora dos resultados alcançados pela companhia.
E se a empresa não tem uma estratégia muito clara em relação à diversidade, equidade e inclusão, ela perde competitividade no mercado, perde talentos e o contato com seus consumidores. Ou seja, no mundo corporativo do século XXI, esta organização está fadada ao fracasso!
Hoje o ponto focal dessa estratégia é o que chamamos de letramento em D&I – ou seja, a educação e o treinamento voltados para a prática da diversidade e inclusão envolvendo a sensibilização da(o)s profissionais, especialmente a alta liderança, para uma nova postura e consciência em relação ao tema. Sem isso, é grande o risco de um(a) colaborador(a) sofrer algum tipo de violência por parte de um(a) colega ou de sua gestão , ato que pode acontecer não de forma intencional, mas por falta de conhecimento a respeito da postura correta para evitar o racismo, a LGBTQIAP+fobia ou qualquer outro tipo de discriminação e/ou preconceito de qualquer natureza. .
É fato que os investimentos nas áreas de D&I têm crescido à medida que o mercado também exige essa mudança. Segundo um relatório publicado pela PwC, 76% das empresas têm colocado D&I como estratégia prioritária para seus negócios. Mas há uma contradição apontada pelo mesmo relatório: apenas 22% d da(o)s funcionária(o)s afirmam ter ciência sobre os esforços implementados em suas próprias empresas sobre o assunto. Ou seja, ainda há organizações que realizam investimentos apenas como “fachada”, sem internalizar ou tampouco aprofundar os esforços, lançando, por exemplo, projetos de atração e seleção antes mesmo de capacitar as pessoas que estão dentro da empresa.
Para não correr esse risco, é necessário investir em educação e treinamento, estabelecendo um processo para esse letramento. Isso, no entanto, é algo que leva tempo e exige algumas etapas prévias para ser bem sucedido. Antes de começar a educar para a diversidade e inclusão, é fundamental ter um diagnóstico que permita à empresa saber em que ponto está em relação à diversidade e se já há essa cultura enraizada internamente. Criar cultura é um estágio essencial, é nele que está baseada toda a ação de letramento da organização. Outro ponto prévio importante é a realização de um censo interno para levantar os grupos minorizados e suas intersecções (subgrupos), a exemplo de ‘mulher, trans e negra’. Daí entra a etapa propriamente dita do letramento.
O letramento é peça chave para que todas as pessoas estejam comprometidas com a inclusão da diversidade e a sua linguagem. Para esse processo, diversas ferramentas podem ser usadas, tais como cursos, palestras, rodas de conversas, dinâmica de grupo, workshops, campanhas da Comunicação Interna da empresa, criação de grupos de afinidade, entre outros.
Falar, conhecer e aprender leva para o estágio final da agenda, que é o de transformação, onde se coloca o conhecimento em prática. E para sair da teoria, é preciso transformar profundamente. O primeiro passo rumo à mudança é entender que, se quiser ser de fato diversa e ultrapassar a barreira de simplesmente incluir políticas de contratação, a empresa precisa ser inclusiva no dia a dia. O segundo passo é a liderança perceber que ela é a responsável pela mudança. É o C-level da empresa que deve estar antenada(o) e inteirada(o) das problemáticas, dando o primeiro passo de exemplo. A partir daí, então, cada colaborador(a) ou profissional também precisa assumir sua responsabilidade, trazendo o processo para a primeira pessoa do singular.
Nosso país tem, hoje, 56% de população negra , 25% de pessoas com deficiência e uma parcela de 11% da(o)s brasileira(o)s se inclui no grupo LGBTQIAP+. Todo esse extrato da população precisa estar refletido dentro das organizações. Para que isso aconteça de forma eficiente e madura, letramento é a palavra-chave.