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Caminhões autônomos: parceiros ou concorrentes dos caminhoneiros?

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Foto: divulgação

*Por Pierre Jacquin, vice-presidente da project44 para a América Latina.

Os avanços tecnológicos na digitalização e na conectividade, que têm dado ao mundo recursos como a inteligência artificial e as redes 5G, também estão desenhando um novo horizonte para o trabalho nas estradas.

Para o Brasil, isso é uma perspectiva excepcional, já que o modal rodoviário é responsável por mais de 60% do transporte logístico do país, e os caminhoneiros sabem como poucos os gargalos e dificuldades que enfrentam, como a má conservação das estradas e riscos relacionados ao roubo de cargas.

Outro ponto que mobiliza a categoria historicamente são as jornadas extensas e exaustivas, ainda que a “Lei do Motorista” (13.103/2015) tenha estabelecido diretrizes importantes para os caminhoneiros, como as pausas obrigatórias para descanso.

Ou seja, existe espaço para a adoção de diversas medidas tecnológicas que podem proporcionar maior eficiência e segurança nas estradas. E entre as novidades está a discussão sobre os automóveis autônomos.

Em alguns lugares do mundo eles já estão disponíveis, desde automóveis de passeio, como alguns modelos Tesla, a caminhões e veículos de transporte público. Eles são equipados com sistemas avançados de sensores, inteligência artificial e automação, permitindo que se movam sem a intervenção humana direta.

É fato: esse tipo de automóvel tem o potencial de aumentar a segurança nas estradas, reduzir os custos operacionais, otimizar o consumo de combustível e melhorar a eficiência logística.

Mas acreditar que isso significaria uma substituição do trabalho humano não é uma previsão realista. Primeiro, porque mesmo automóveis desse tipo precisam de um motorista capaz de entrar em ação caso algum imprevisto aconteça.

Em segundo lugar, porque para todos os efeitos, ainda estamos no início dessa jornada, no qual ganhos relevantes estão sendo obtidos ao organizar dados e investindo em melhor visibilidade no supply chain.

É incrível pensar que, até pouco tempo atrás, tínhamos acesso a pouquíssimos dados para monitorar o transporte rodoviário e apoiar decisões estratégicas nas operações logísticas.

Das informações apenas a posteriori, gravadas, passamos a contar com sistemas de telemetria e, mais recentemente, a soluções mais avançadas de visibilidade em tempo real. Sensores e dispositivos de internet das coisas (IoT), favorecidos por tecnologias como o 5G, mudarão drasticamente o cenário do modal rodoviário.

Então, acredito que estamos muito mais próximos, isso sim, de uma inteligência artificial que efetivamente vá melhorar as condições de trabalho para os motoristas. Uma IA que, ao mesmo tempo, também possa lidar com um volume imenso de dados para as companhias, e ajudando os condutores a tomar melhores decisões, diminuindo perdas e aumentando ganhos.

Até porque, e isso é muito importante de se apontar, um motorista de caminhão não é somente um motorista de caminhão. Como assim? Digamos que a tecnologia autônoma poderia cuidar, hoje mesmo, da condução de toda a frota brasileira de caminhões.

Os motoristas estariam dispensados de suas funções? Não, pois fazem muito mais do que ficar no volante, mesmo que fosse necessário tomar o volante em uma emergência. Eles executam todo tipo de tarefa, como a verificação de veículos e o carregamento adequado de produtos na carroceria, mantêm diários de serviço e fazem atendimento ao cliente. E essas tarefas estão longe de serem automatizadas. Mesmo que um sensor detecte, por exemplo, um pneu furado, o motorista terá que trocá-lo e consertá-lo.

Ao pensarmos nos desafios que são inerentes ao quadro brasileiro, há de se pensar também nas diferentes condições de estradas e situações de tráfego. Aqui, as rodovias possuem características diversas, incluindo variações na qualidade da infraestrutura, presença de obstáculos e falta de sinalização adequada em alguns trechos.

Além disso, a interação com outros veículos e com pedestres requer uma complexa capacidade de tomada de decisões e adaptação em tempo real, o que ainda representa um desafio para a tecnologia autônoma.

Ao final, não há dúvidas de que os caminhões autônomos podem trazer avanços para a indústria logística e o supply chain, mas não porque irão substituir os motoristas, mas porque irão fazê-los trabalhar em melhores condições, até mesmo fazendo alertas de fadiga e monitorando sinais de saúde. Não se trata de uma relação de antagonismo, mas de parceria.

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