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Fika: o cafézinho sueco que pode mudar o ambiente corporativo

Foto: divulgação.
Foto: divulgação.

Uma das questões que mais tem levantado debates nas empresas é a necessidade dos colaboradores desenvolverem a cultura da troca e do aprendizado constantes. De acordo com a edição mais recente do relatório The Future of Jobs, elaborado todos os anos pelo Fórum Econômico Mundial, seis em cada 10 trabalhadores precisarão se atualizar até 2027. No entanto, apenas metade das pessoas que estão no ambiente corporativo hoje têm acesso a oportunidades de treinamento adequadas.

Pesquisas do psicólogo americano William Glasser, aplicadas à educação, mostram que a forma mais eficiente de aprendermos é ensinando nossos conhecimentos às outras pessoas. William Glasser dedicava suas pesquisas principalmente à saúde mental e comportamento humano, ou seja, sua teoria sobre aprendizado está baseada, acima de tudo, no bem-estar de quem está aprendendo.

O conceito de que o aprendizado depende de uma sala de aula e da hierarquia entre mestre e alunos já é bastante debatido. Para os adultos, principalmente os que estão no mercado de trabalho e ocupam o ambiente corporativo, a prática nos mostra que, muitas vezes, o aprendizado contínuo pode ser mais eficaz e se torna ainda mais potente quando é compartilhado entre as pessoas.

A Suécia abriga um hábito cultural que pode nos servir como inspiração e até exemplo a ser seguido. Os suecos desenvolveram um ritual que é capaz de aliviar o estresse do dia a dia e ainda proporciona trocas riquíssimas: o Fika. O momento do Fika pede um café, um doce ou um salgado para saborear, mas principalmente, o encontro entre pessoas, sejam elas amigos, familiares ou colegas de trabalho.

O Fika não é um simples “coffee break”, para falar de tarefas ou de compromissos, é um momento genuíno de trocas com um único objetivo: relaxar e se conectar verdadeiramente com as pessoas. Desses momentos, os suecos costumam sair inspirados, motivados e abastecidos de mais repertório ou conhecimento, não porque o Fika depende ou pressupõe que as pessoas estejam lá para serem ensinadas, mas porque proporciona conexão.

Na Suécia, Fika é um momento muito valioso da rotina, especialmente no ambiente de trabalho. Além do cafezinho e das tortas ou bolos irresistíveis, o fika tem o poder de conectar áreas de forma bastante intuitiva e natural, o que melhora a cooperação no ambiente corporativo e também aumenta o sentimento de pertencimento dos colaboradores. Muitos grupos até revezam quem vai levar a gostosura da vez – comes e bebes feitos em casa ajudam a expandir a sensação de desacelerar a rotina e realmente estar presente durante o Fika.

Para quem não é sueco, mas vive no país ou está passando um período por lá, é fundamental fazer parte dos momentos de Fika – é uma demonstração de disposição para se integrar à cultura da Suécia e uma das mais bem-sucedidas formas de aproximação humana estabelecida em um país escandinavo, já que incentiva o cultivo dos sentimentos de comunidade e pertencimento.

Fika é mais do que uma parada para o café, é um hábito que, se bem inserido na rotina, é capaz de mudar nossa relação com o ambiente de trabalho e deixá-la muito mais saudável, mais cooperativa e mais humana.

A conexão entre as pessoas é tão significativa que, em 2022, a OMS divulgou em um estudo que mostrou que os casos de depressão aumentaram 25% no primeiro ano de pandemia – consequência direta da necessidade de isolamento. O estresse causado pelo medo, solidão, luto e incertezas financeiras afetou diretamente nossa saúde mental. A pesquisa da OMS aponta para a percepção do que vivenciamos todos os dias: em períodos difíceis, o contato entre as pessoas é capaz de aliviar sofrimentos – aliás, é fundamental.

Na Suécia, Fika é um hábito nacional e indispensável, assim como é aqui no Brasil o costume de tomar banho todos os dias. Como podemos incorporar o Fika na rotina, ainda que não faça parte da cultura brasileira? Como pesquisadora e, principalmente, como alguém que procura estabelecer relações cada vez mais genuínas com as pessoas que conheço, tenho buscado marcar alguns cafés e momentos de encontro fora da agenda de reuniões de trabalho.

Não é fácil, tendo o dia tomado por compromissos, mas elevar o valor do Fika e seu impacto na saúde mental diária depende do que os suecos já tem feito há muitos anos: prática e compromisso com o que nos caracteriza como seres sociais, além da abertura para aprender e ensinar – que na verdade, de acordo com o psicólogo Glasser, é a melhor maneira de aprender.

Para a assimilação do conhecimento e do aprendizado formal, também é essencial que haja intervalos prazerosos. As pesquisas mais recentes em neurociência mostram que o cérebro precisa de descansos para consolidar o que aprendemos e transformar as novas informações de memória transitória para memória duradoura.

A pesquisadora de psicologia cognitiva Barbara Oakley, em seu livro Aprendendo a Aprender, explica que o cérebro aprende de dois modos diferentes, que se complementam: o modo focado (quando estamos com a atenção totalmente voltada para assimilação de conhecimento) e o modo difuso (quando o cérebro está relaxado). De acordo com ela, o cérebro precisa alternar entre os dois modos para que os aprendizados sejam efetivos.

Para as empresas que buscam incentivar o desenvolvimento contínuo e incorporá-lo ao dia a dia dos times, a pausa de qualidade para o café, o pedaço de torta da vez e a conexão genuína entre os colaboradores vai potencializar ainda mais os espaços de trocas e, portanto, de aprendizado, além melhorar o bemestar no trabalho – os suecos que o digam.

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Co-fundadora do Todas Group

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